27/8/2008 |
Nenhum barril de petróleo sairá do pré-sal por muitos anos ainda, mas o governo já conseguiu criar uma enorme confusão sobre o assunto e pôr em risco a sua credibilidade e a reputação do Brasil como país seguro para investimentos. O Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), formado por 229 associações e empresas vinculadas ao setor, já cobrou em nota oficial um esclarecimento sobre as declarações do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, publicadas no fim de semana: afinal, haverá desapropriação de áreas concedidas a empresas para exploração de reservas e quebra de contratos? Empresários e profissionais ligados à indústria do petróleo e do gás e à petroquímica têm fortes motivos para inquietação, diante do falatório desencontrado e da crescente politização do assunto, com mobilização de grupos partidários e sindicais em torno de bandeiras levantadas pelas próprias autoridades. Autoridades têm prometido não quebrar os contratos em vigor, negociados segundo o atual modelo de exploração do petróleo, lembraram os autores da nota. Mas dúvidas foram criadas nos últimos dias e é indispensável um esclarecimento. No sábado, o Globo citou declarações do ministro de Minas e Energia a respeito de possíveis desapropriações. Se ocorrerem, esclareceu o ministro, haverá uma indenização justa. Falando em justiça, ele ainda acrescentou: “Não é justo que uma empresa chupe um petróleo que também é da União” - como se, pelos contratos em vigor, a concessionária não pudesse apropriar-se do produto extraído, pagando à União as taxas e royalties convencionados. Em seguida, numa entrevista publicada no domingo no Estado, ele tentou amenizar as declarações: as conversas em Brasília tinham sido sobre “modelos usados no mundo”. Nada estava decidido, acrescentou. Mas acabou admitindo: se for preciso unitizar reservas - isto é, juntar poços para efeito de exploração - e não houver acordo entre as concessionárias, o governo poderá recorrer ao Judiciário ou pedir uma arbitragem à Agência Nacional do Petróleo (ANP). A emenda não melhorou o soneto. Apenas o enriqueceu com um toque de humor involuntário. Afinal, o presidente da ANP já afirmou dever satisfações apenas ao presidente da República, por ele apontado como seu chefe. Será esse o mediador escolhido por Lobão? As declarações do ministro talvez não sejam mais que um balão-de-ensaio. Talvez não passem de mera precipitação. Mas não se deve descartá-las, como se não tivessem a menor importância. Num debate marcado por tanta excitação ideológica e por tantos interesses partidários e eleitorais, nenhum indício de risco é desprezível. Um ponto importante o ministro Lobão reconheceu em sua segunda entrevista: nas conversas do comitê interministerial encarregado de estudar a exploração do pré-sal, a revisão de contratos e possíveis desapropriações foram mencionadas. Mais uma vez, portanto, o governo inverteu a ordem das questões, como se o primeiro desafio não fosse a mobilização de recursos técnicos e financeiros para a exploração de reservas muito profundas e distantes da costa. Isso, evidentemente, depois que a Petrobrás fornecer ao governo as medidas exatas das “riquezas” de que está falando. Até para desapropriações seria preciso levar em conta a limitação de recursos. Como o governo pagaria pela retomada de áreas concedidas a empresas? Como calcularia a indenização, se nem conhece o tamanho das reservas? Perguntou o consultor Adriano Pires, pesquisador do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura. O toque de bom senso foi dado pelo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. A idéia, disse ele ao Estado, é manter vivo o interesse de empresas privadas, até porque os investimentos necessários para a exploração do pré-sal são muito elevados e o governo não dispõe de todo esse dinheiro. “Buscamos compatibilizar”, explicou Bernardo, “o desafio de achar um modelo melhor para o petróleo e a possibilidade, bastante plausível, de manter as empresas privadas participando do processo.” Se é essa a intenção, o governo está fazendo tudo errado. Para ajustar o modelo, não precisa rasgar nem desfigurar a Lei do Petróleo, e muito menos admitir, mesmo como hipótese, quebra de contratos e desapropriações. |