A perspectiva de um desastre nos EUA não deve ocorrer. Só teremos um período longo de expansão abaixo do potencial
A DIVULGAÇÃO dos dados preliminares do PIB americano para o segundo trimestre do ano permite uma análise clara da dinâmica da economia mundial nessa primeira parte de 2008. As informações confirmam algumas mudanças importantes que estão ocorrendo na maior economia do planeta. A mais relevante delas é que os EUA estão crescendo por causa do dinamismo do mundo emergente. O resultado das exportações menos importações adicionou 2,4% ao crescimento do PIB nesse período. Sem essa contribuição, o PIB teria se contraído em 0,5%.
Isso vem ocorrendo há alguns trimestres, o que dá a essa nova dinâmica uma estabilidade maior do que a considerada pelos analistas mais conservadores. Enquanto o dólar estiver enfraquecido e a demanda doméstica americana estiver fraca -e deve ser por algum tempo-, teremos a inusitada situação de ver a maior economia do mundo sustentada pelo mundo emergente. Essa observação fica reforçada porque o resto do mundo desenvolvido -Europa e Japão, principalmente- também está entrando em um período de baixo crescimento econômico. A isso se chama "DECOUPLING", mesmo que essa expressão não seja a melhor.
Outro dado relevante nos números do PIB do período abril-junho é a redução do impacto negativo dos investimentos privados no setor da construção civil. No último trimestre, ele reduziu-se pela metade em relação aos trimestres anteriores.
Um sinal, ainda tênue, de que o pior pode ter ficado para trás em termos de contribuição negativa do setor.
Essa mesma leitura pode ser encontrada em outras estatísticas do setor e em notícias pontuais como o aumento das vendas de residências tomadas pelos bancos por falta de pagamento em mercados importantes como a Califórnia. Mas será preciso mais tempo para que essa indicação atinja cores mais fortes e mais seguras. Entretanto, a perspectiva de um desastre na maior economia do mundo, trombeteado por muitos, não deve ocorrer. Teremos apenas um período longo de crescimento abaixo do potencial.
Outro dado importante é que as empresas tiveram uma redução expressiva de seus estoques -cerca de 1,9% do PIB- nesse período. Implica dizer que o setor industrial americano tem evitado o acúmulo indesejado de estoques, o que poderia levar a uma redução mais expressiva da atividade nesse setor nos próximos meses. Isso é importante para o restante do ano, quando a demanda dos consumidores deve apresentar uma redução em razão do fim dos estímulos fiscais criados pelo governo Bush. Tenho defendido a tese de que vivemos em um mundo econômico em forte movimento de transformações. Uma das indicações desse processo está no fato de que os EUA dependem hoje da demanda de outras economias para crescer. No passado, tínhamos o contrário, dada a dimensão de seu mercado. Uma outra indicação, complementar a essa, vem do Brasil. Nesse mesmo segundo trimestre de 2008, a diferença entre importações e exportações brasileiras vai retirar algo como 2,5% do crescimento do PIB brasileiro. Estamos exportando demanda de nossos consumidores e empresas. Esses são fatos econômicos que se complementam, sendo um a outra face do outro.
Nesse mesmo trimestre, pela primeira vez em sua história moderna, a China também está contribuindo com sua demanda para o crescimento de outros países. O comércio exterior chinês exportou 0,2% da demanda interna da China. Talvez para os EUA...