Com a questão ecológica no centro das atenções internacionais e em momento tão especial entre nós, quando se definem os parâmetros de um projeto econômico que tanto garanta a proteção da Amazônia com o crescimento sustentável quanto a capacidade de confirmar nossa posição como futura potência mundial, é sintomático que venha para o palco desse embate um político como o petista-verde Carlos Minc. “Saudações libertárias e ecológicas”, foi como ele se despediu dos telespectadores do “Jornal das Dez”, da Globonews, na primeira entrevista exclusiva que deu depois de ter sido confirmado como ministro do Meio Ambiente. As palavras não foram escolhidas ao acaso, assim como sua maneira de vestir e de se apresentar são rigorosamente calculadas
Um dos fundadores do Partido Verde, em 1986, ele representa a vertente urbana do movimento ecológico brasileiro, que não por acaso foi fundado por três exilados políticos que tiveram experiências européias com a militância política ecológica: o próprio Minc, Alfredo Sirkis e Fernando Gabeira.
Aos 57 anos, Minc mantém a jovialidade na maneira de vestir, com seus coletes coloridos, na informalidade com que trata o poder e compensa a calvície deixando longos e desalinhados os cabelos que lhe restam.
Parece a confirmação física da tese de que o movimento libertário de 1968 tem como uma de suas principais conseqüências o movimento ecológico.
No novo livro de Zuenir Ventura “1968, o que fizemos de nós”, uma retomada 40 anos depois do best-seller “1968, o ano que não terminou”, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso diz que “ficaram dois 68 como herança daqueles tempos, um 68 generoso e um 68 perverso”. Na sua análise, foram “os verdes” que capturaram o lado generoso, o que havia de inovador naquela proposta de uma nova civilização.
No mesmo livro, Fernando Gabeira, hoje deputado federal candidato a prefeito do Rio numa coligação do PV com o PSDB, lembra que o conceito de “desenvolvimento sustentável”, que hoje se encontra no centro dos embates entre ecologistas e desenvolvimentistas, foi definido em uma reunião em Estocolmo em 1972, e provocou na ocasião entre os militares no governo a mesma reação que provoca hoje em certos setores do governo Lula: “Nossos representantes exprimiam a visão da ditadura militar, a de que precisávamos crescer a todo custo”, lembra Gabeira, ressaltando que, àquela época, “qualquer conversa em torno da preservação do meio ambiente significava para eles uma tentativa dos países mais avançados de barrar o nosso desenvolvimento”.
O mesmo raciocínio que faz agora o presidente Lula classificar de “pura sacanagem” as críticas aos biocombustíveis, ou que o faz ficar incomodado com a preocupação “com alguns bagres”, que atrasa o licenciamento para hidrelétricas na Amazônia.
Além de manter a mesma visão da ex-ministra Marina Silva de preservar o meio ambiente na sua relação com os empresários do agronegócio, especialmente na região Norte do país, não se furtando a enfrentar o poder político do governador de Mato Grosso, Blairo Maggi, o novo ministro traz para a discussão o lado urbano do ecologismo, a chamada “agenda marrom”.
A empresa de consultoria Macroplan, do economista Cláudio Porto, coloca essas questões das grandes cidades brasileiras como fundamentais para uma política de meio ambiente que leve o país ao desenvolvimento.
Em cenários prospectivos já analisados aqui na coluna, o melhor projeto que permita dar “um salto para o futuro” prevê a desburocratização dos licenciamentos ambientais, sem que isso signifique permissão para a devastação ambiental, na linha que o novo ministro tem defendido, e uma “agenda marrom” que abranja os seguintes pontos: 1Expansão acelerada dos sistemas de esgotamento sanitário nas cidades com forte participação do setor privado; 2Melhoria da qualidade e maior racionalidade no uso da água; 3Melhoria na destinação do lixo, consolidação da reciclagem e intensificação da recuperação dos solos e passivos; 4Redução da taxa de crescimento das emissões de gases de efeito estufa, visando adequação a acordos internacionais, e dinamização da produção de biocombustíveis no país para mercado interno e exportação; 5Início de esforços sistemáticos para adaptação preventiva de áreas potencialmente vulneráveis às mudanças climáticas; 6Maior sustentabilidade no uso dos recursos naturais e desenvolvimento de oportunidades de negócio ligadas à “economia verde”.
A questão do lixo urbano é um tema fundamental para uma agenda ecológica moderna, e a crise de Nápoles só vem reafirmar essa prioridade. O deputado Fernando Gabeira esteve no Haiti acompanhando a atuação da Força de Paz que o Brasil comanda, e pôde ver como a remoção do lixo urbano foi fundamental para resgatar a auto-estima da população das favelas dominadas por gangues.
Sua campanha à prefeitura do Rio tem como um dos temas “a cidade limpa”, em sentido amplo: não sujar a cidade com propaganda eleitoral e também conscientizar o cidadão, especialmente nas zonas mais pobres, sobre a importância da remoção do lixo.
Como se vê, a ecologia está entrando de maneira ampla na agenda de desenvolvimento do país, uma herança generosa dos movimentos que há 40 anos também colocaram em evidência questões como o racismo, a emancipação da mulher, os direitos dos homossexuais, todos, ao lado da redução das desigualdades sociais, temas atuais da agenda do país moderno que pretendemos ser.