quinta-feira, maio 01, 2008

Celso Ming Consolidação da virada

É apenas o começo. A classificação dos títulos de dívida externa do Brasil a grau de investimento conferida ontem pela Standard & Poor?s (S&P) ainda não muda tudo. Esta é apenas uma das mais importantes agências de classificação de risco. O Brasil será reconhecido de fato como devedor confiável quando as outras duas grandes, a Moody?s e a Fitch, derem o mesmo veredicto. Mas isso virá logo.

O Brasil tinha, até agora, uma ficha suja com os credores externos. Passou calote, decretou moratórias e impôs cortes unilaterais nos contratos financeiros. Por isso, seus títulos de dívida externa eram classificados como de risco. Podiam pagar rendimento melhor, mas sabe-se lá se davam resgate no dia acertado.

Essa condição impedia que bancos centrais, fundos de pensão, carteiras conservadoras de investimento e todas as aplicações de patrimônio que dão prioridade à segurança adquirissem esses títulos.

As mudanças não começaram ontem. De 1994 para cá, os fundamentos da economia começaram a virar: a inflação foi controlada, as contas públicas se reequilibraram, os fluxos de moeda estrangeira para dentro e para fora do País ficaram superavitários e, mais que tudo, o Brasil exibe agora reservas de US$ 195 bilhões. O credor externo não tem mais por que temer o calote.

Por conta do novo status, muita coisa pode mudar. Os fundos que não podiam comprar papéis do Brasil porque não eram confiáveis agora correrão atrás. Como títulos dessa qualidade estão em falta, os juros dessa dívida devem despencar. É inevitável que a nova fase se transfira também para o endividamento em reais.

Em todos os países cujos títulos foram promovidos a grau de investimento, os bancos centrais tiveram de reduzir os juros básicos. Ainda não estão claros os mecanismos pelos quais isso acontecerá aqui porque o Banco Central (BC) terá de ajustar sua política de juros para conter a inflação.

Os afluxos de dólares tanto para aplicação em renda fixa como para investimento de risco devem aumentar. Isso significa que a cotação do dólar vai baixar ainda mais, como a reação de ontem deixou claro (confira o gráfico). É provável que o BC terá de voltar às compras.

A novidade não beneficiará apenas os títulos do Tesouro. As empresas privadas daqui ganham um novo mercado de dinheiro disponível a custos bem mais baixos. Isso pode criar um problema para o BNDES, que terá de estudar como competir com credores externos dispostos a emprestar dinheiro a juros bem mais camaradas.

A Bolsa também ganha com isso por duas vias. Primeira, porque mais capitais investirão em empresas nacionais. Segunda, porque juros mais baixos empurrarão os aplicadores para opções de risco.

É a ficha do Brasil passada a limpo.