O Brasil pulou, em poucos anos, do sexto para o maior produtor de carne do mundo. Em 1991, o país produzia 56 milhões de toneladas de grãos; no ano passado, produziu 133 milhões de toneladas e virou um dos maiores produtores mundiais de grãos. É também o mais competitivo produtor de biocombustível. O sucesso do agronegócio brasileiro, porém, não pode ser nossa tragédia.
Podemos fazer disso a nossa fortuna, ou continuar errando. Errar é mais fácil; basta fazer como sempre foi feito. Todo ano de crescimento econômico mais forte, o desmatamento sobe. Sempre que os preços dos principais produtos de exportação do agronegócio sobem, aumenta a taxa de destruição da Amazônia. Do jeito que está até agora, o país parece estar num dilema: não crescer e encolher exportação para manter estabilizada a taxa de destruição da nossa riqueza amazônica.
Evidentemente o melhor é conciliar crescimento e preservação. O governo está dizendo que suspenderá financiamento para quem desmatar. Mais importante é mudar a forma de emprestar.
Só do Basa, de 2003 a 2007, os pecuaristas receberam R$ 1,89 bilhão de empréstimos a taxas extremamente subsidiadas para operações na região. Os juros para empresas estiveram entre 26% e 34% ao ano. Os pecuaristas da Amazônia pagavam de 5% a 9%. No Pronaf, 1% a 4%. O gráfico abaixo, de um estudo de Paulo Barreto, do Imazon, mostra que o ritmo do desmatamento acompanhou a evolução dos preços da soja e do boi no ano anterior.
A queda dos preços reduzia o desmatamento no ano seguinte; a alta elevava o desmatamento. Segue também o ritmo da concessão dos empréstimos. O pior ano foi o de 2004. “O pico do empréstimo ocorreu em 2004, coincidentemente ano do pico de desmatamento”, conta o texto de Paulo Barreto. Não é que o governo não tem impedido o desmatamento; ele o financia.
“Entre 1990 e 2006, foram desmatados 30,6 milhões de hectares na região, estimativa do Inpe.
Descontados desta área 5,3 milhões de hectares destinados para agricultura e reflorestamento, estimamos que aproximadamente 25,3 milhões de hectares foram ocupados por pastos”, diz o estudo.
O Basa empresta hoje exigindo título de propriedade.
(Duro é dizer, na Amazônia, que um título é realmente legal). E exige que o tomador do crédito tenha reserva legal, a área de mata preservada no percentual de cada região.
— Mas hoje basta a averbação da reserva legal no cartório. O proprietário vai ao cartório e diz que tem reserva legal. É isso — explica Valmir Ortega, secretário de Meio Ambiente do Pará.
Ele diz que, se fosse exigido o georreferenciamento da propriedade (a imagem por satélite), quando fosse detectado algum desmatamento, já se saberia quem o fez, e o crédito seria suspenso.
Valmir Ortega acha que há várias medidas do governo que podem ter grande impacto: como a que tenta pegar o crime na cadeia produtiva.
— A grande novidade é embargar a área desmatada ilegalmente. Antes, se a autoridade flagrasse, aplicava uma multa, mas o produtor continuava usando a terra. Não vai mais ser assim.
Agora, frigorífico que comprar de pecuarista que desmatou pode ser acusado de receptação de objeto de crime.
Uma das medidas é suspender a permissão de desmatamento legal nos municípios campeões de destruição da floresta. Adianta? Valmir admite que hoje 99% do desmatamento no Pará são ilegais. Nas áreas atingidas pelo decreto, praticamente 100% são feitos ilegalmente. O governo está proibindo o proibido.
Agora estão chegando grandes grupos econômicos no Pará, com métodos modernos de produção em grande escala e que se apresentam como empreendedores.
Um deles é o banqueiro Daniel Dantas, que teria comprado meio milhão de hectares. Perguntei ao secretário se é possível saber se a terra tem origem legal ou não.
— É impossível encontrar hoje 500 mil hectares de terra legal no Pará — afirmou, taxativo.
O Brasil não quer saber quanto custa o progresso do agronegócio. Este é o caminho para que o custo do progresso seja impagável.
E a conta recairá não sobre nós, mas sobre os futuros brasileiros.