DAVOS. Uma das ilhas de excelência na economia brasileira, em contraste com a atual crise de energia, é a potencialidade futura de nossa produção de energia, tanto com relação a petróleo e gás quanto às energias alternativas, especialmente os biocombustíveis. E esses são assuntos muito discutidos aqui em Davos, até mesmo de maneira indireta. Há a preocupação com a escassez de água em algumas regiões hoje, e também no futuro, ao mesmo tempo em que a abundância de água é exaltada pelos defensores dos biocombustíveis, que dependem dela, de muito sol e muito espaço para alavancar a produção de etanol ou biodiesel.
Se os biocombustíveis são uma alternativa limpa ao petróleo, a plantação de cana de açúcar e milho, ou oleaginosas, para a produção de combustível pode incentivar desmatamentos e provocar o aumento dos preços dos alimentos.
Jacques Diouf, diretor da FAO, não teve dúvidas de incluir entre as causas do aumento do preço a procura por biocombustíveis.
Ao mesmo tempo, esses esforços por biocombustíveis estimulariam também o esgotamento dos recursos hídricos. Por estar no centro de todas essas questões, o Brasil tem seu peso específico reconhecido, e exatamente por isso o presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, uma das poucas autoridades brasileiras presentes no Forum Econômico Mundial, está participando de todas as discussões que envolvem esses temas recorrentes aqui, além da politização do fornecimento de energia.
Mais uma vez esteve em discussão em Davos o nacionalismo que transforma o fornecimento de recursos naturais dos países exportadores, sejam eles a Rússia de Putin ou a Venezuela de Chávez, em instrumentos de pressão política. O mundo continua a debater a questão da energia como arma politica, que está dando a países emergentes poder de protagonistas da cena internacional.
A energia deve ser vista não apenas como um assunto econômico, mas sobretudo geopolítico, especialmente quando países como a Venezuela e a Bolívia são liderados por governos que usam petróleo e gás como instrumentos políticos, tanto interna quanto externamente.
Num debate sobre as consequências das misturas de nacionalismo com recursos naturais, foi a vez de Gabrielli ser político em relação aos problemas com nossos vizinhos, afirmando que o que eles fazem é o que sempre foi feito historicamente. Isto é, tentar tirar o maior proveito possível de seus recursos naturais: “É compreensível, e é preciso ter paciência, paciência e paciência” — frisou.
Em outro debate, no entanto, ficou patente a preocupação de países da América Latina com a possibilidade de que a construção de grandes gasodutos regionais possibilite uma ação política, como já aconteceu com a Rússia, que provocou interrupções de suprimento com a Ucrânia, ou para abastecimento interno devido aos rigores do inverno, deixando parte da Europa desprotegida.
Uma maneira de reduzir esse risco seria criar uma interdependência entre os países, aumentando os investimentos regionais. O preço do barril do petróleo levanta questões: a maioria das recessões após a Segunda Guerra Mundial foi provocada por choques de petróleo.
Agora, juntamente com o preço em alta, a crise financeira americana cria um ambiente econômico deprimido que pode levar a uma redução do consumo e consequente diminuição do preço do barril, como também poderá fazer com que o preço atinja patamares impensáveis, criando um ambiente mais atritado ainda entre países consumidores e produtores.
Num seminário especial sobre o futuro dos biocombustíveis, houve quem garantisse que chegou o momento em que investimentos em novas formas de energia se fazem obrigatórios.
A crise aumenta a importância dos combustíveis alternativos como o biodiesel e o etanol, no qual o Brasil se destaca.
Questionado sobre o desmatamento da Amazônia num simpósio sobre energia, o presidente da Petrobras disse que a utilização de soja para biocombustível é ainda muito incipiente, e que esta não deve ser a principal causa do problema.
Lembrou ainda que o Brasil tem uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo, baseado principalmente nas hidrelétricas, e é pioneiro na produção e utilização do etanol. Em vários painéis, a questão da água foi abordada por diversos ângulos. A escalada internacional de demanda por água, e a inadequada oferta seria um problema tão urgente e ainda mais complexo do que os esforços para proteger o meio-ambiente.
O Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon, ressaltou em um painel que a Guerra em Darfur teve início entre fazendeiros quando, devido à falta de chuvas, a água ficou escassa. A falta de água pode colocar em risco o crescimento econômico, a saúde, aos direitos humanos e até mesmo à segurança nacional de países. A diminuição no volume de água do Lago Chad, na África, coloca em risco cerca de 30 milhões de pessoas, e até mesmo afluentes do Rio Amazonas secaram, segundo relatos em painéis no Forum Econômico Mundial.
A crise não atinge apenas os povos mais pobres: escassez de água afeta 1/3 dos Estados Unidos e 1/5 da Espanha.
Uma idéia lançada em um dos debates pode ser tão perigosa quanto lucrativa para países que, como o Brasil, têm as maiores reservas de água do planeta: transformar a água em commodity, dando-lhe um valor econômico correspondente à sua importância.
Em alguns exemplares da coluna de ontem foi atribuído ao banco Morgan Stanley o estudo sobre os Brics ( Brasil, Russia, Índia e China), apontados como os futuros líderes econômicos mundiais. Na verdade, o estudo é da Goldman Sachs.