O Estado de S. Paulo |
29/1/2008 |
Em fase de baixa credibilidade, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) reúne amanhã seu Comitê de Política Monetária (Fomc, o Copom deles) para redefinir o tamanho dos juros. Há apenas uma semana, o Fomc tomou a iniciativa surpreendente de antecipar-se a essa reunião e baixar os juros básicos (Fed funds) em dose também surpreendente, de 0,75 ponto porcentual, para 3,5% ao ano. O mercado financeiro global espera mais uma tesourada. Crise de credibilidade é algo muito grave num banco central que vive de conduzir expectativas, em proporção até mais alta do que em acionar alavancas técnicas. É um neurocirurgião com tremedeira nas mãos. Sobre a condução do Fed pesa um punhado de críticas não respondidas. A primeira delas é a de que ele criou a crise a partir de 2002, no período da administração Greenspan, quando trabalhou com juros baixos demais (dinheiro à vontade) e, assim, se dedicou a assoprar as bolhas. A segunda, também no tempo de Greenspan e no atual, quando não foi capaz de controlar as operações bancárias. O presidente do Fed, Ben Bernanke, confessa que ainda não conseguiu entender as operações do mercado financeiro que desembocaram nessa crise. Se não conseguiu entender, também não tinha como controlar. E deu no que deu. Terceira crítica, o Fed demorou demais a tomar consciência da gravidade da crise e talvez ainda não a tenha percebido. Aí também as críticas se voltam para o período Bernanke, que assumiu em fevereiro de 2006. O Fed vacilou entre atacar a inflação e apagar o incêndio. Também parece não ter diagnosticado a tempo o risco de uma forte crise do crédito. Enfim, a acusação é de que o Fed mais reage aos fatos do que age sobre eles. É esse bloqueio de iniciativa que os críticos denunciam quando afirmam que “o Fed está atrás da curva”. Para culminar, o mercado desconfia de que o corte inusitado definido na semana passada veio pelo pânico da direção por ter interpretado equivocadamente a derrubada dos preços das ações na Europa. O Fed teria entendido que os investidores entravam em parafuso, defendendo-se de um crash das bolsas e, no entanto, a queda foi resultado do desmonte das posições do Société Générale de Paris, vitimado pela fraude monstro de US$ 7,2 bilhões. Desta vez, a questão relevante está em saber se uma nova injeção de dinheiro no mercado financeiro seria capaz de reverter a ameaça de grave crise do crédito. Paradoxalmente, não falta dinheiro. A liquidez já era excessiva antes e agora está ainda maior. O crédito está paralisado por falta de confiança. Os bancos já não sabem como avaliar risco de crédito numa situação em que não está claro quem está mal e quem está melhor nessa crise. Eles próprios não se respeitam porque não sabem quantos esqueletos podem despencar de uma hora para outra de um armário qualquer. Por isso se fecham. E o que se pergunta é se a situação se reverteria se o Fed despejasse mais liquidez num sistema circulatório bloqueado por tromboses múltiplas. Embora possa estar tomando a decisão certa, o Fed estará sujeito a mais críticas, pois o problema agora é mais de credibilidade do que de acerto nas decisões (veja o Confira). Confira O primeiro deles é o de queda da inflação ou deflação, que se seguiria a uma forte recessão nos Estados Unidos. Nesse caso, os juros devem continuar em queda. O outro cenário é o de inflação crescente, que seria o resultado de uma recessão fraca conjugada com alta continuada dos preços dos combustíveis e dos alimentos. Nesse caso não faria sentido derrubar ainda mais os juros. |