sábado, dezembro 22, 2007

O vilão errado

O vilão errado

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Quando era candidato à presidência da Colômbia, Álvaro Uribe anunciou que não negociaria com as Farc, um grupo originalmente marxista que se transformou em bando criminoso e há cerca de 40 anos desestabiliza regiões inteiras no interior do país. Depois de eleito, Uribe se deixou convencer pela Igreja e por familiares de pessoas seqüestradas pela narcoguerrilha de que era necessário libertá-las e isso só poderia ser feito por meio de negociação. Em cinco anos, o governo fez pelo menos dez tentativas - inúteis - de negociar a libertação dos reféns. A última foi a que teve o caudilho Hugo Chávez como mediador, uma experiência encerrada por Álvaro Uribe porque o presidente venezuelano exorbitou, entrando em contato direto com militares colombianos e prometendo fazer aos narcoguerrilheiros concessões inaceitáveis para a Colômbia.

Assim que Chávez foi dispensado, os meios de comunicação passaram a difundir declarações e "análises" que apresentavam o presidente Álvaro Uribe como um ogro insensível, cuja intransigência irracional impedia a libertação de pelo menos 45 pessoas em poder das Farc. "Não entendo o que ocorre com o presidente", afirmou, por exemplo, a mãe da ex-candidata a presidente Ingrid Betancourt, seqüestrada em fevereiro de 2002. "Ele disse que tinha coração, mas estamos esperando há seis anos." É compreensível a angústia dos familiares dos reféns. Mas o fato é que não foi o governo colombiano que os seqüestrou e mantém presos em condições degradantes. Os responsáveis pelo sofrimento dessas pessoas são, única e exclusivamente, os narcoguerrilheiros. No caso de Ingrid, desde 2003 as Farc não divulgavam provas de que ela estava viva. Há dias, essas provas foram apresentadas, juntamente com as de que outros 15 reféns estão vivos - mas se continua sem saber o que houve com mais 31 reféns, cuja libertação estava sendo negociada. E as preocupações com a incolumidade dessas pessoas são justificadas, não só porque estão submetidas a condições precárias, mas porque, recentemente, 21 reféns, na maioria parlamentares, foram mortos a tiros pelas Farc, que alegou terem eles ficado sob fogo cruzado num tiroteio com o Exército.

Agora, as Farc anunciam, usando os bons ofícios da agência cubana Prensa Latina, que entregarão três reféns, inclusive uma criança de três anos nascida em cativeiro, ao coronel Hugo Chávez, em data e lugar não especificados. Trata-se, evidentemente, de uma manobra para dar combustível aos setores da opinião pública colombiana e internacional que querem a volta do caudilho à condição de mediador. O objetivo das Farc, com isso, é obter a desmilitarização dos municípios de Florida e Pradera, para que os narcoguerrilheiros possam descansar, treinar e recrutar enquanto se processam as negociações. Hugo Chávez não apenas concorda com essa exigência, como mantém relações extremamente amistosas com as Farc. Esta semana o diário espanhol El País publicou longa reportagem que demonstra a existência de pelo menos quatro bases da narcoguerrilha em território venezuelano, usadas, também, para exportar cocaína para o Caribe e os Estados Unidos.

O presidente Uribe, é claro, não admite a criação de uma zona desmilitarizada. Essa experiência foi feita por seu antecessor, Andrés Pastrana, que cedeu uma área de 42 mil km² às Farc, durante três anos e meio, e não conseguiu a libertação de um único refém e avanço algum nas negociações de paz. Uribe admite apenas a criação de uma "zona de encontro" de 150 km², em local ermo para que a população não fique à mercê dos narcoguerrilheiros e onde seja feita a troca de reféns por militantes presos.

O fato é que a política de "segurança democrática" de Álvaro Uribe tem dado resultados. A criminalidade nas cidades foi reduzida a níveis civilizados. Os seqüestros e as ações terroristas foram reduzidos em cerca de 75%. As deserções estão desfalcando os quadros das Farc: só neste ano cerca de 1,7 mil guerrilheiros se entregaram ou depuseram armas. E todos os prefeitos do país podem residir nas sedes dos municípios, ao contrário do que ocorria em 2002, quando 246 deles estavam impedidos de governar pelas Farc.

É esse combate sem tréguas, que está enfraquecendo as Farc, que se procura, agora, solapar.