sábado, novembro 24, 2007

DORA KRAMER Sem eira nem beira

A tramitação da CPMF é o exemplo presente, mas não é o único a compor um cenário de desorganizadas idas e vindas em que atuam governistas e oposicionistas, todos correndo às cegas atrás de recuperar o prejuízo da véspera na tentativa de transformá-lo no benefício do dia seguinte.

A cada momento, surgem nos dois campos, estratégias novas. Não raro divergentes entre si, revelam exatamente a ausência de pensamento estratégico na ação parlamentar.

Tudo ali é tático, baseado na agonia do momento. É nítida a ausência de coordenação e mesmo o governo, que habitualmente funciona como referência, não tem um eixo de conduta. Ora negocia, ora ataca, ora cede, ora ameaça desprezar os aliados, ora avaliza, ora rompe acordos, tenham sido eles firmados com a própria base de apoio ou com a oposição.

Esta acompanha o ritmo da enlouquecida polca: um dia quer atrasar a votação da CPMF, no noutro pretende apressar. Num instante corrobora acertos entre o PT e o PMDB para salvar o mandato de Renan Calheiros, mas corre para explodir o mesmo acordo quando vê a repercussão negativa nos jornais.

Neste aspecto, o presidente licenciado do Senado tem razão quando reclama de falta de coerência dos fiadores de seu mandato, alguns deles pertencentes às hostes da oposição que, não podendo controlar seus enrustidos, cobra posição firme dos petistas na esperança de, ao mesmo tempo, contar com eles para a condenação e culpá-los na eventualidade de absolvição.

Os assuntos misturam-se, contaminam uns aos outros, tudo serve de justificativa, nada parece obedecer a uma ordenação lógica.

Primeiro era preciso julgar Renan Calheiros rapidamente para não prejudicar a CPMF; como a oposição reagiu, os governistas passaram a alegar que o adiamento era bom para eles, pois impediria a deflagração do processo de sucessão na presidência do Senado enquanto não estivesse votada a prorrogação do imposto.

Sim, mas na hipótese inicial, a da pressa, Calheiros hoje já teria renunciado em definitivo à presidência e a nova eleição, por exigência do regimento, seria na semana que vem. Faz sentido?

Nenhum. A tradução desse estresse foi o "dane-se" - dito "no sentido de sinônimo" - dirigido a tudo, a todos e a ninguém em particular pelo presidente em exercício do Senado, Tião Viana, ao se sentir cobrado a esclarecer razões e intenções.

É o menos indicado a fornecê-las porque não as têm. E, à falta do que dizer, diz qualquer coisa. Ontem mesmo, diante da decisão do PTB de deixar o bloco do governo, liberando a bancada para votar como quiser na CPMF, Viana avaliou: "Isso não afetará a votação de matérias como, por exemplo, a CPMF."

Como não, se foi a decisão da líder do PT de tirar o senador Mozarildo Cavalcanti da Comissão de Constituição e Justiça para que ele não votasse contra a CPMF o que motivou a saída do PTB?

E, por falar em PTB, acrescente-se ao quadro das incongruências o fato de pertencerem ao partido em retirada o ministro que sai da pasta da articulação política (Walfrido Mares Guia) e o que provavelmente entrará, José Múcio Monteiro, por sinal líder do governo na Câmara.

Tião Viana reconhece que a "base está um pouco fragilizada"; o presidente Luiz Inácio da Silva outro dia foi além, disse que está "totalmente desorganizada".

Soaria como chamamento à ordem, não fosse, na verdade, uma involuntária autocrítica. Logo após a reeleição assumiu ele mesmo a tarefa de coordenador político, comandante de um conselho onde, pelo visto, nada de útil se aconselha.

Tucanoduto

Em tese, a denúncia do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, contra o ministro Walfrido Mares Guia e o senador Eduardo Azeredo neutraliza reações do governo e da oposição porque o constrangimento seria recíproco.

Mas isso é só na teoria. Na prática, o prejuízo agora é do PSDB. A denúncia sai exatamente no momento em que o partido faz seu congresso e primeiro ato em direção à campanha de 2010. Além disso, Walfrido está na denúncia por causa de suas relações tucanas; não é do PT que, em matéria de mal-estar, já enfrentou bem piores.

Bloqueio seletivo

Repartições públicas, bem como empresas privadas, têm sistemas de bloqueio de acesso à internet, cada qual de acordo com seus critérios profissionais.

No Ministério da Fazenda, por exemplo, não há acesso a páginas de esportes, entretenimento, músicas, sites de relacionamento e, mais recentemente, à categoria "política e opinião".

Nela, a página do PT é livre, mas o funcionário que tenta acesso a do PSDB recebe uma mensagem do "comitê de segurança de clientes" do Serpro, informando sobre a indisponibilidade de páginas "não profissionais".

De onde se conclui que, pelo critério do ministério, o site do PT é instrumento de trabalho.