EDITORIAL |
O Globo |
25/10/2007 |
Uma cidade que se esgueira entre o mar e a montanha e se espalha nas franjas da Floresta da Tijuca sobre rios assoreados ou mal canalizados, o Rio, com 6 milhões de habitantes, constitui-se um desafio constante ao administrador público - desafio não superado com grande freqüência. O dia de caos enfrentado ontem pelo carioca, por causa do deslizamento de terra sobre a pista Norte-Sul do Túnel Rebouças, agravado pela chuva, resulta, na essência, de graves erros cometidos ao longo de anos pelo poder público. Visto pelo ângulo oficial, a culpa recai sobre a topografia da cidade. Com muitos morros, vias estratégicas para o trânsito passam por vários túneis. Não bastassem os riscos de desmoronamento, algumas dessas estradas urbanas são ligações essenciais, senão únicas, entre bairros e regiões. Caso do Rebouças, elo-chave entre a Zona Sul e a Zona Norte. Sua interrupção sobrecarregou outro túnel, o Santa Bárbara, vias expressas ( Linhas Amarela e Vermelha) e o Centro da cidade. Com a chuva e as falhas em sinais de trânsito, completou-se a receita do caos. O despreparo da prefeitura para enfrentar a situação ficou evidente de várias formas. Uma delas é o fato de o deslizamento sobre o túnel ter começado no fim da tarde de terça-feira, o Rebouças ter sido fechado às dez da noite - uma hora antes do normal, para manutenção - e o carioca constatar, na manhã de quarta, a inexistência de um plano mínimo de emergência para tornar o trânsito menos engarrafado. Foi possível passar uma hora e meia arrastando-se na chuva, pára-choque com pára-choque, e encontrar no trajeto apenas um passivo guarda municipal de trânsito. Impossível não estabelecer alguma relação entre a ocupação desordenada das encostas por favelas e a quarta-feira em que o Rio parou. Ontem, circulou entre técnicos da prefeitura a denúncia de que uma ligação clandestina de água na favela do Cerro Corá teria começado a desestabilizar o terreno sobre a entrada do túnel. Mesmo que a hipótese seja afastada, é indiscutível que favela é um risco para todos, incluindo seus moradores. Nas ocupações sobre vias, o perigo aumenta. Ao ser leniente com a favelização, causa de desmatamento e degradação ambiental, o poder público se torna responsável por problemas como este no Rebouças e coloca em risco favelados e não-favelados. A conformação do Rio exige cuidados especiais da administração municipal. Como eles não existem, acidentes ocorrem e as autoridades pedem para a população ficar em casa. Ruas vazias ajudam a prefeitura, mas infernizam a vida de quem vota e paga impostos. |