No último sábado do verão, a praia de Copacabana amanheceu com 700 cruzes pretas fincadas na areia no trecho defronte ao Copacabana Palace. Era um protesto contra a morte de igual número de pessoas pela violência no Rio nos primeiros meses do ano, segundo dados de uma ONG (organização não-governamental) responsável pelo evento. Naquela manhã, ao abrir as janelas e deparar com as cruzes, que não estavam ali na véspera, os gringos hospedados no Copa devem ter se encantado com a criatividade brasileira. Que idéia para um comercial de TV -fazer da praia um cemitério! Os bandidos foram ver e também gostaram. Era um reconhecimento à sua capacidade de implantar o terror. Já o carioca, talvez pela morbidez da idéia, passou ao largo. O espetáculo só atraiu os ativistas. Em compensação, foi intensamente filmado e fotografado -nada mais plástico que o Rio, não?-, e as imagens correram o mundo, acompanhadas de pouco ou nenhum texto. Nesta segunda-feira, a mesma e funérea ONG promoveu na Cinelândia, no centro da cidade, uma passeata de "luto pelo Rio". O povo foi convocado a usar camisas pretas e portar velas acesas, como num enterro. Apesar do horário -sete da noite, com muita gente nas ruas- e da tradição da Cinelândia como palco de protestos, mais uma vez apenas os ativistas prestigiaram. Pelo visto, o carioca, já campeão mundial de minuto de silêncio, quer salvar o Rio, não enterrá-lo. Performances inspiradas em Zé do Caixão ou no "halloween" são só uma dramaturgia pobre para a indústria do medo -esta, sim, séria- que se tenta impor. Uma indústria ideal para os síndicos que mandam gradear os edifícios, para os blindadores de carros e fabricantes de insulfilme e para ONGs que se candidatam a consciência da população. |