sexta-feira, março 02, 2007

Liberdade obrigatória - Nelson Motta



Folha de S. Paulo
2/3/2007

Se o fundamental em qualquer eleição é quem vota em quem, para fazer o quê, a primeira questão de qualquer reforma eleitoral deve ser o voto obrigatório.
Que valor pode ter o voto de alguém que escolhe sob coação? São votos eticamente nulos e politicamente inconscientes, que só beneficiam os piores candidatos. Que tal uma lei obrigando os cidadãos a serem livres?
Em nenhum país civilizado do mundo um cidadão é obrigado a votar. Aqui, como símbolo patético do país da impunidade, a pena para quem não cumpre a lei absurda é uma multa ridícula e, depois de três faltas, o pior castigo é não poder ter emprego público nem poder fazer negócios com o governo.
Os "progressistas" temem que o voto facultativo piore ainda mais as coisas, os coronéis do terceiro milênio obrigarão suas clientelas cativas a se alistar, os burgueses desiludidos não se levantarão de suas poltronas para votar nos "homens de bem", e os bandidos vencerão.
A maioria dos políticos de todos os partidos não quer mudar nada, é pelo clientelismo e a ignorância que eles se perpetuam no poder. Um cidadão, um voto, é o princípio democrático que eles mais amam e usam: com a manada obrigada a mugir, fica mais fácil contar as cabeças e distribuir a ração. Chega dessa conversa mole de que é um dever, mais um. Dever é uma obrigação, como pagar impostos, que fazemos à contragosto; direito é a liberdade de escolher. Ou não.
No Rio de Janeiro, por exemplo, tivemos que "escolher" entre Rosinha e Benedita. Não valia nem a sola do sapato para ir à zona eleitoral votar nulo.
E, já que as duas são evangélicas, é bom lembrar que foi a maioria absoluta da multidão votante de Jerusalém que condenou Jesus Cristo à morte. Pilatos foi só o juiz eleitoral.