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Ouça os promotores, ministro | ||||
Aos 64 anos, há 35 no Ministério Público paulista, o promotor de justiça Flávio Nunes da Silva é um conciliador vocacional. Temperamento brando, ótimo ouvinte, riso fácil, a voz sempre suave só trai uma leve irritação quando convidado a comentar o tratamento dispensado pela legislação brasileira a bandidos de alta periculosidade. "Há pessoas para as quais não há solução, não há cura", diz Flávio na sala que ocupa desde 1981 no forum de Araraquara (200 mil habitantes, a 250 quilômetros da capital). "É impossível mudar o caráter ou a personalidade de um sociopata". Ele não pensava assim no começo da carreira: "Até ser transferido para cá, achava todo mundo recuperável", conta. "É que eu só tinha contato com gente presa em cadeias de cidades pequenas". O presídio de Araraquara, com 700 celas, compõe um microcosmo criminoso muito mais abrangente e revelador. Ali, conheceu milhares de delinqüentes. Descobriu que a população carcerária deve ser dividida em duas categorias. E que só fora apresentado aos integrantes da primeira. "São pessoas normais, que realmente não tiveram oportunidades na vida e erraram", resume. "Merecem respeito e tratamento digno enquanto quitam a dívida com a sociedade". A segunda categoria, liderada por autores de crimes hediondos, é menos numerosa. E muito mais perturbadora. Os membros dessa tribo, constatou, requerem o rigor e a severidade que faltam à legislação brasileira. "São psicóticos que a própria psiquiatria forense considera sem chances de recuperação", argumenta. "Têm total discernimento dos atos que praticam e os praticam com prazer". O promotor endossa sem restrições a tese do patologista criminal vivido por Al Pacino em 88 minutos: desvios mentais não são incompatíveis com a sanidade legal. "Com exceção dos loucos delirantes, todos sabem o que fizeram", reitera. "Muitos são bastante articulados, inteligentes". À extensa relação de casos exemplares, acaba de juntar o protagonizado no Rio por Társio Ramires, 25 anos, carrasco do casal de franceses que dirigia a ONG Terr'Ativa. "Ele torturou e matou os próprios benfeitores", espanta-se. As vítimas haviam tirado Ramires da rua. Deram-lhe um lar, carinho, emprego e a chance de cursar uma faculdade. Generosos, não pressentiram que chocavam o ovo da serpente. Flávio sustenta que bandidos dessa linhagem devem cumprir a sentença em regime fechado, sem direito a reduções da pena, sem acesso a privilégios e vantagens que hoje contemplam os prisioneiros, incluídos os responsáveis por atrocidades inverossímeis. "Pelas normas atuais, mesmo psicóticos perigosíssimos não podem ficar na cadeia mais de 30 anos", ressalva. "Mas todos são libertados muito antes. É preciso modernizar urgentemente a legislação". Agora no Ministério da Justiça, Tarso Genro prometeu mobilizar especialistas na busca de medidas que amenizem a crise da segurança. Ouça os promotores públicos, ministro. Ouça a voz da sensatez.
Cabôco Perguntadô Ministra turbinada
O companheiro deu certo na vida Heróis dos canaviais Yolhesman Crisbelles | ||||
25 / 03 / 2007 |