O presidente Lula ainda não convidou o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, permanecer; nem lhe disse que escolherá outro.
Ele foi ficando, como outros ministros, mas, nesta área, o gerúndio pode não ser o melhor tempo. Os diretores também estão em compasso de espera. Foi esta diretoria — alguns de malas prontas, outros dispostos a ficar — que se reuniu esta semana no meio da pressão para que aderissem ao PAC.
Quem será o presidente do Banco Central do Lula II? Ainda não está claro. O BC está isolado como sempre esteve desde a saída do ex-ministro Antonio Palocci.
Governo e oposição cometeram o mesmo erro esta semana: querem que o Banco Central adira ao esforço para que o país acelere o crescimento do país. O governador de São Paulo, José Serra, chegou a sugerir que o presidente Lula interferisse na decisão dos juros. Segundo Serra, quem foi eleito presidente é que deve responder pela política dos juros, e não pode deixar o assunto entregue a essa “figura misteriosa” que é o Copom .
Imagine só se, nos Estados Unidos, alguém do Partido Democrata sugeriria ao presidente Bush que ele mesmo decidisse a taxa de juros, e não a figura misteriosa do Fomc (Federal Open Market Committee).
O Fomc decide as taxas de juros nos Estados Unidos depois de reuniões de avaliação de todos os dados da conjuntura, como o Copom faz aqui no Brasil.
Perguntados sobre a “contradição” entre o anúncio do PAC e a decisão do BC, os ministros Guido Mantega e Dilma Rousseff deram mais ou menos a mesma resposta: o importante é que a trajetória continua sendo de queda. Uma resposta que revela, de novo, falta de compreensão de qual é o papel dos bancos centrais em qualquer economia.
Cabe ao Banco Central garantir a estabilidade da moeda, ele não tem que ter função de fomento.
O Brasil já foi um país em que a decisão de juros dependia de uma pessoa só.
Uma vez, no governo Sarney, um diretor decidiu levar para 50% a taxa de juros porque achou que era o número certo. Dobrou a taxa numa manhã. Já foi o país em que era nomeado para o Banco Central um amigo do presidente, como aconteceu, por exemplo, com Elmo Camões, no mesmo governo Sarney. Não por acaso, foi o país da mais longa superinflação do mundo.
Isso não quer dizer que o BC não erre. No ano passado, vários especialistas em política monetária disseram que os juros estavam caindo devagar demais.
Tanto a crítica estava certa que a taxa de inflação ficou bem abaixo da meta. Como o Banco Central tem que perseguir a meta ao menor custo do produto, parte da frustração do crescimento de 2006 se deve ao fato de que a dose foi forte demais .
Os juros caíram 6,75 pontos percentuais nos últimos 17 meses, e a economia continua crescendo a 2,5%. Não é a taxa de juros que garantirá o crescimento maior. Os empresários têm hoje o benefício de uma TJLP de 6,5%. Apesar disso, os empresários brasileiros têm investido pouco no país. No ano passado, o Brasil teve mais saída de investimento direto que entrada. Houve mais empresas brasileiras investindo no setor produtivo no exterior que empresas remetendo capital direto para o Brasil. Houve também uma remessa recorde de lucros. Isso significa que as empresas estão achando menos interessante reinvestir no Brasil seu capital. O país está perdendo atratividade, na avaliação tanto de empresas brasileiras, quanto de estrangeiras .
E isso não é culpa das taxas de juros, mas de todo o ambiente de negócios no Brasil, que faz com que país perca a disputa com outros países. Acumulamse problemas, como carga tributária alta, encargos sobre a folha salarial, burocracia, lentidão da Justiça, incerteza regulatória, corrupção.
Tudo encarece investimento.
O Banco Central manteve juros altos demais no primeiro mandato. Essa uma avaliação meio geral.
Mas o balanço do seu trabalho é positivo. O país entrou no primeiro mandato com uma inflação de 13%, com desconfianças em relação à capacidade do novo governo de manter estabilidade, com reservas de US$ 16 bilhões, e uma dívida externa alta. A inflação hoje é de 3%, a meta está sendo cumprida, desconfiança se dissipou, as reservas estão em US$ 90 bilhões, a dívida externa caiu. O ajuste externo foi feito graças à capacidade exportadora brasileira, mas coube ao Banco Central o trabalho de reconquistar a confiança e mantêla, de perseguir taxas de inflação mais baixas.
Mesmo assim, a autonomia que tem e que exerceu durante todo o primeiro mandato é uma autonomia concedida pelo presidente da República, que pode retirála a qualquer momento.
Certos nomes que circulam como cotados para o cargo representam uma mudança total de política.
Cabe ao presidente decidir quem vai estar no cargo nos próximos quatro anos. O pior que pode acontecer a Lula é a inflação voltar a subir. Preços em alta terão o poder de corroer sua popularidade.
Há também, sobre Banco Central, pressão para que ele aceite cálculos contábeis mais favoráveis aos banqueiros quebrados do Proer. Ao escolher quem comandará o BC nos próximos quatro anos, presidente Lula deveria pensar nesses dois pontos.
São dois fios desencapados.
Inflação subindo e benefícios a ex-banqueiros podem ser uma mistura explosiva.