O Estado de S. Paulo |
31/1/2007 |
“Mais uma vitória como essa e estarei arruinado”, constatou Pirro, rei de Épiro, ao receber os cumprimentos por derrotar os romanos na batalha de Heracléia, contabilizando perdas monumentais. Deu origem à expressão “vitória de Pirro”, ou “vitória pírrica”, bem adequada à sinuca em que se envolveu o governo Luiz Inácio da Silva na disputa pela presidência da Câmara dos Deputados. O Palácio do Planalto, que antes ganharia em qualquer hipótese, agora recolherá perdas com qualquer resultado. Se ganhar Arlindo Chinaglia, do PT, terá de administrar um ambiente conflituoso decorrente da vocação petista para o atrito e da acentuada polarização entre governo e oposição no Parlamento; se vencer Aldo Rebelo, PT e PMDB disputarão com ele o poder no cotidiano. Se por raciocínio hipotético remoto o vitorioso for Gustavo Fruet, nem se fala: será o PSDB na presidência da Câmara. É verdade que um partido que mal vem se agüentando nas pernas teria pouca chance de fazer bonito em posição de destaque, mas tanto poderia se perder de vez como também poderia se aprumar em torno da inesperada vitória. Todas as avaliações internas apontam para a realização de um segundo turno entre Aldo e Arlindo e todas elas encerram a perspectiva de uma guerra de extermínio. Tanto que, desde a pesada de mão do candidato à reeleição no debate de segunda-feira, dizendo que a vitória do PT fará mal à democracia, a palavra de ordem na base governista vem sendo a da necessidade de “reconstrução” da unidade da tropa após a disputa. Portanto, os aliados de Lula assumem-se em vias de destruição. E por que isso, se parecia tudo tão bem arrumado logo após a reeleição do presidente da República? Muito provavelmente por excesso de esperteza ou presunção. Presunçoso, Lula avocou para si o papel de articulador, menosprezando a evidência de que presidentes precisam de anteparos, principalmente quando se trata de arbitrar divergências. Esperto, quis adiar as insatisfações decorrentes da divisão dos ministérios para depois da escolha do presidente da Câmara e acabou contratando uma crise desnecessária. Se Lula acredita que a confusão lhe será favorável, pois reinará mais forte quanto mais fragilizado e desorganizado estiver o Congresso, erra no cálculo, pois Parlamento à deriva é uma bomba de efeito imprevisível. A endurecida de Aldo Rebelo no debate dá a medida de seu engasgo com o PT e, senão com o presidente diretamente, pelo menos com boa parte do governo. Primeiro, foi incentivado a disputar a reeleição, coisa que não faria a bordo de seu minúsculo PC do B sem o respaldo do Planalto. Depois, foi praticamente convidado a se retirar da disputa pelos ministros Tarso Genro e Dilma Rousseff. Em seguida, precisou desmentir que aceitaria um ministério para desistir da presidência da Câmara, versão que equivalia a comparar Aldo Rebelo a uma espécie de Severino Cavalcanti. A ofensiva dos petistas que reclamaram da “inadequação” e “deselegância” da atitude do oponente no debate de segunda-feira chegou ao ponto de o presidente Lula mandar que o PT não exagerasse na humilhação a Rebelo. Resultado, o deputado escolheu o momento preciso, um debate com transmissão ao vivo três dias antes da eleição, para socar o fígado do adversário, apontando risco à democracia no caso de vitória e concentração de muito poder na seara petista. Puro sofisma para, na luta política, alimentar e capitalizar animosidades. Em 2003, o PT, com o beneplácito de Aldo Rebelo, então líder do governo, não só concentrou o mesmo poder, na presidência de João Paulo Cunha, como o fez em situação de quase unanimidade nacional. Nem por isso a democracia esteve em jogo. Por que estaria agora que o País enxerga muito joio e pouco trigo no partido, por isso mesmo fragilizado na capacidade de impor suas vontades? Se o argumento de Aldo Rebelo não se sustenta na realidade, revela-se como sinal de que, passada a eleição, um articulador político será pouco para o governo construir uma relativa paz entre governistas no Congresso. O presidente Lula precisará de um mágico. Carreiras solo Cada qual a seu modo, os governadores José Serra e Aécio Neves vão produzindo fatos em que são protagonistas únicos em cena. Logo depois do lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento Serra calou, esperou todo mundo falar e, três dias depois, emitiu sozinho sua opinião sobre o pacote. Anteontem, Aécio desembarcou na reunião dos governadores em Brasília e comandou o espetáculo, ignorando o combinado entre os colegas da Região Sudeste de serem representados por Paulo Hartung, do Espírito Santo. Escorpião Constatação mordaz de um tão desalmado quanto qualificado tucano a propósito da relação entre os governadores de São Paulo e Minas Gerais: “O Serra sempre imagina que o Aécio está engendrando alguma coisa contra ele. O Aécio tem certeza.” |