Antigamente, na geração anterior à minha, era moda cultivada entre as gentes: o indagar-se. No encontro de intelectuais com o papa, em 1981, aqui no Rio, Alceu Amoroso Lima contou que, em Veneza, em 1913, sentado no bar do hotel Danieli, teve uma dessas crises e por pouco não ia cometendo suicídio. Mestre Alceu procurava então, aos 19 anos, "um sentido para a vida", moda que todos os rapazes de sua geração, e alguns da geração seguinte, achavam tão bacana quanto, nos anos 60/70, usar as roupas hippies, fumar maconha e gostar dos Beatles. Cada geração, em certo sentido, tem a moda que merece. No caso de Alceu, ele não se precipitou. Decidiu esperar pelos acontecimentos. E, em 1928, converteu-se ao catolicismo. De Alceu passo para Bastos Tigre. Ele fazia a si próprio as perguntas de sempre: quem sou, onde estou, para onde vou? Depois de rolar sabedoria e pessimismo, o poeta dá uma trava violenta na pesquisa filosófica e responde: "Quem sou? Funcionário da nação. Onde estou? No bonde. Para onde vou? Para a repartição". Acredito que a humildade -e não a esperança- é a virtude que dá ao homem o dom de suportar o mundo. Sou homem sem Fé e sem Esperança. Mas, à minha maneira, cultivo uma humildade básica, que talvez nem seja humildade, mas simples mancômetro. Toda busca que encontra Deus no fim do caminho nasce de um orgulho mal-informado: o homem não aceita o absurdo de sua condição, a falta de sentido para a vida -a própria e a geral. Então, a presença de Deus se encaixa no problema, peça de armar que completa a paisagem, feita à imagem e semelhança do próprio problema. O homem criou Deus para se justificar, para continuar sendo diferente das beterrabas e dos siris. Daí a necessidade de Deus e de sua criatura, o homem. |