domingo, outubro 01, 2006

O futuro do Banco do Brasil Maílson da Nóbrega


Em suas três encarnações, o Banco do Brasil foi parte importante de nossa história. Nasceu em1808 como banco emissor, tal qual o Banco da Inglaterra e o da Suécia. Forneceu a moeda divisionária que ajudou a expandir o comércio e a viabilizar o funcionamento da corte portuguesa que para aqui viera. A segunda encarnação (1851) surgiu com Mauá, o maior empresário do Império. A terceira e atual (1905) lhe granjeou prestígio interno e externo.

Nunca, todavia, o BB havia sido posto a serviço de um partido como agora. Dois diretores, entre dirigentes indicados pelo PT mais por sua militância do que por seu preparo (felizmente uma minoria), usaram suas posições para levantar fundos destinados a fins políticos condenáveis e para armar dossiês contra candidatos da oposição.

Tais casos mostram como a instituição é vulnerável às más ações do seu acionista-controlador. Antigos funcionários, como eu, viram casos de má conduta, resultantes geralmente dos incentivos que os subsídios proporcionavam para a prática de irregularidades. Jamais se ouviu falar, porém, de algo como a recente atuação de petistas no BB.

Ao longo de sua trajetória, o BB supriu o setor público de quadros qualificados, formados sob valores morais e nos princípios da ética, da disciplina e da dedicação. Muitos se destacaram nos três Poderes federais: deputados, senadores, ministros de Estado e membros do STF e do Tribunal de Contas. Nas outras esferas, foram governadores, prefeitos e secretários. Dirigiram estatais federais e estaduais, incluindo o próprio banco.


O BB gozou de enorme e inigualável poderio financeiro. Da criação da Carteira de Redescontos na sua própria estrutura (1921) à extinção da “conta de movimento” (1986), gerava internamente seus próprios recursos. Não precisava captá-los no mercado. Provinham de orçamentos paralelos nascidos do atraso institucional das finanças públicas. Apesar disso, foram poucos os casos de irregularidades, o que se explica pelos controles internos e por seus valores e princípios.

A agilidade do BB o tornou instrumento para arrecadar tributos, executar o Orçamento (a Secretaria do Tesouro é de 1986) e ser agente de programas de crédito oficial. Até 1965, exercia as funções de banco central, parte das quais reteve até recentemente.

A estrutura montada para servir o governo tornou o BB uma organização pesada, mas a inflação e o modo como se supria de recursos disfarçavam suas ineficiências. O fim desses dois mecanismos desvendou enormes prejuízos, o que obrigou o Tesouro a sanear suas finanças nos anos 1990.

A contrapartida do fim da “conta de movimento” foi a sua atuação em todas as áreas permitidas aos bancos comerciais. A partir de 1995, veio a reviravolta. Ao contrário do que se temia, o BB se reestruturou (aqui e no exterior), se reinventou e se tornou uma instituição inovadora e competitiva.

Os escândalos recentes justificam um novo despertar. A elite do BB já percebeu que o governo é hoje muito mais um fardo do que um alicerce. É preciso disseminar essa consciência e entender os riscos das indicações políticas para cargos no seu conselho diretor e outros da sua estrutura.


A privatização seria o melhor caminho para o futuro da instituição. O BB tem tudo para repetir o êxito da Vale do Rio Doce, o que permitiria remunerar melhor e reter os seus talentos, expandir suas operações e ampliar o seu papel no desenvolvimento, mas isso seria utopia na fase atual do Brasil.

De fato, a proposta de privatização serviria para que certos políticos mobilizassem os sentimentos estatistas que ainda dominam grande parte da sociedade. A esquerda atrasada se oporia. O governo seria derrotado.

Ainda levaremos muito tempo para debater e afinal aceitar essa idéia. Enquanto isso, há que construir regras que livrem o BB da ingerência política na escolha de seus dirigentes. Não seria a criação de uma reserva de mercado para seus funcionários, mas a adoção do critério exclusivo do mérito para recrutá-los entre os mais capazes, dentro ou fora do BB.

No Reino Unido, os cargos de alto nível no Poder Executivo, como os equivalentes ao nosso Secretário da Receita Federal e outros, são preenchidos mediante utilização de “head hunters”. Essa poderia ser uma saída para proteger o BB e outras estatais de influências políticas nefastas.