domingo, outubro 29, 2006

DORA KRAMER Campanha permanente

As eleições dominaram o cenário durante quase todo o 1º mandato de Lula

Formalmente, terminou ontem a campanha eleitoral. A mais longa da história, pois a disputa eleitoral prevaleceu sobre qualquer outro assunto e serviu de pano de fundo a todos os debates durante praticamente todo o mandato do presidente Luiz Inácio da Silva.

Lula nunca desceu do palanque onde passou a vida toda e isso ficou muito bem demonstrado por seu estilo discursivo de governar, com grande apreço a pronunciamentos - não raro dois ou três por dia - e aversão a entrevistas e questionamentos em geral. Em quatro anos, só deu uma entrevista coletiva - contrariando prática comum nas democracias - e só se dispôs ao contraditório quando lhe interessou: agora, no segundo turno da campanha pela reeleição.

A oposição, por sua vez, resolveu subir no palanque quando começaram a aparecer os escândalos de corrupção. PSDB e PFL, que no início não viam chance de voltar ao poder tão cedo, passaram a considerar fortemente a hipótese de Lula não se reeleger.

Contribuiu para a animação oposicionista a vitória do PSDB em São Paulo, com José Serra, e a derrota imposta ao PT no Rio Grande do Sul, com a eleição de José Fogaça para a prefeitura de Porto Alegre, depois de 16 anos de administrações petistas.

Em dezembro de 2005, um ano marcado por adversidades, a oposição vislumbrava a vitória na sucessão presidencial quase que como uma certeza. Lula vivia seu período de popularidade mais baixo.

Em março, com o presidente já em franco estado de recuperação, o PSDB escolheu para disputar com Lula seu candidato menos competitivo. Ficou com Geraldo Alckmin porque, como diz agora a campanha do PT, não quis trocar o certo pelo duvidoso e optou por garantir o governo de São Paulo, com José Serra.

Se ganhasse a Presidência com Alckmin, estaria no lucro. Se não, aguardaria a vez na esperança de que Lula padeça do mesmo veneno que vitimou os tucanos na campanha de 2002: o imenso desgaste provocado por 8 anos de poder.

É nisso que o PSDB aposta agora. O partido está como Roberto Jefferson: sublimou a derrota, adotou o discurso segundo o qual é melhor Lula na Presidência mais 4 anos, se enfraquecendo à medida que não puder atender às expectativas da população, do que na oposição ainda forte e se preparando para retomar o governo em 2010, atrapalhando os planos de José Serra e Aécio Neves.

É uma conta arriscada, visto que a oposição apostava também no 'sangramento' em praça pública do presidente neste último ano e o que se viu foi uma recuperação e capacidade de resistência invejáveis.

Mas, a despeito dos riscos, é nisso que a oposição aposta. E é por isso que a campanha eleitoral terminou de direito, mas, de fato, recomeça logo depois de proclamados os resultados de hoje e vai perdurar pelos próximos 4 anos.

Terra arrasada

Da mesma forma que a ambigüidade fez bem ao PMDB - elegeu a maior bancada na Câmara, pode ficar com a maioria no Senado e fez um bom plantel de governadores -, a assertividade não foi boa conselheira para o PFL.

O partido é seguramente o maior derrotado desta eleição. Sua preponderância no Nordeste foi quebrada pelo PT e no Sudeste não conseguiu avançar. Detém hoje só um posto importante na região, o que faz do prefeito do Rio de Janeiro, Cesar Maia, um herdeiro credenciado do espólio.

Em termos de governos de Estados, o PFL está fora de todos no Nordeste, bem como de prefeituras de capitais. A única candidata do partido com chance de ganhar é Roseana Sarney, no Maranhão, uma dissidente já em vias de deixar a legenda.

Derrota emblemática foi a da Bahia e, tudo indica, será também a de Pernambuco, onde pela primeira vez em muitos anos o PFL não terá nem o governo nem a prefeitura do Recife ou de qualquer cidade da região metropolitana.

A esperança pefelista seria presidir o Senado, mas o PMDB se prepara para cooptar três ou quatro senadores de maneira a tirar do PFL o último bastião.

Isonomia

Fernando Collor de Mello ainda nem assumiu seu mandato de senador por Alagoas e já dá passos no sentido de se reintegrar ao cenário político com tudo o que tem direito e mais um pouco.

Não é gratuito o ato de requerer à Casa Civil os privilégios de ex-presidente já assegurados por decisão da Justiça. Collor não precisa dos dois carros e seis funcionários que a lei lhe garante. Até porque o Senado lhe dá automóvel e servidores.

O movimento do agora senador e presidente impedido de completar o mandato por corrupção tem o objetivo de cobrar simbolicamente isonomia com os outros ex-presidentes, José Sarney, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso.

Com isso, zera o jogo. Daí em diante, pode vir a reivindicar outros ressarcimentos. Nas urnas, com o discurso de que não fez nada que não se tenha feito pior depois dele. Conviria, portanto, atenção aos atos do referido senhor. Principalmente se a oposição não for percebida como contraponto eficaz ao PT.