quarta-feira, agosto 23, 2006

Dora Kramer - Um horizonte risonho e franco

O ESTADO

dora.kramer@grupoestado.com.br

Representante do PT na disputa pelo governo de São Paulo com a tranqüilidade de quem tem mais quatro anos de mandato assegurados no Senado, Aloizio Mercadante não vê tormentas no horizonte, a despeito de todos os problemas que cercam seu partido e de todas as turbulências previstas para um segundo mandato, caso o presidente Luiz Inácio da Silva seja reeleito este ano.

O cenário cor-de-rosa começa pelo projeto de reeleição em si - para Mercadante, só Geraldo Alckmin e mais uns dois ou três incréus ainda põem em dúvida a vitória de Lula - e se estende pela eleição da bancada federal do PT. Contrariando todas as previsões, e de certa forma o bom senso, o senador acha que o PT não reduz sua bancada na Câmara, fica em torno dos mesmos 90 eleitos em 2002.

Ganha a reeleição, absolvido nas urnas o PT - "20% dos eleitores continuam apoiando a legenda" -, o senador também acredita que um segundo mandato de Lula seria pleno de serenidade política.

Na opinião dele, não seria uma continuidade da crise instalada no caso Waldomiro Diniz e acentuada depois com o escândalo do mensalão, simplesmente porque o acirramento dos ânimos políticos não interessaria a ninguém, nem à oposição.

Aloizio Mercadante lança um dado novo no debate sobre o futuro próximo: segundo ele, Lula não sendo mais um fator de conflito eleitoral, pois, reeleito, não representaria ameaça para 2010, os adversários tenderiam a tratá-lo com menos rigor.

Junto a isso, a maioria dos governadores eleitos ou reeleitos (Aloizio Mercadante concorda, serão quase todos de oposição) precisaria do governo federal administrativamente falando e, portanto, teriam todo o interesse em manter a interlocução com o Palácio do Planalto politicamente desobstruída.

Mesmo aqueles que são desde já candidatos a presidente em 2010, como Aécio Neves, de Minas Gerais, não seriam uma fonte de embate político desde os primeiros instantes de um possível (para ele certíssimo) governo Lula. A exceção seria justamente o adversário de Mercadante, José Serra.

"Por isso é tão importante eu ganhar o governo de São Paulo", diz o senador, mostrando a razão pela qual o presidente Lula anda pessoalmente empenhado em pedir votos para ele no horário eleitoral, apesar de a Justiça já ter decidido que é contra a lei.

Mesmo com o favoritismo acentuado de Serra - apontado pelas pesquisas hoje como candidato a vencer no primeiro turno -, o PT nutre realmente uma esperança de ganhar e faz toda força pela vitória, exatamente porque enxerga em São Paulo o único foco de conflito político capaz de criar problemas para Lula nos próximos anos.

Há quem veja nisso também o motivo real para o PSDB ter escolhido Serra como candidato ao governo de São Paulo e Geraldo Alckmin para a disputa à Presidência.

Para não trocar o certo pelo duvidoso e assegurar a ocupação da trincheira paulista, vital para o posicionamento estratégico futuro, o tucanato escalou o time titular para a disputa estadual e o reserva para o plano nacional.

Mas, na opinião de Mercadante, não serão apenas os governadores os interessados em retomar o ambiente de calmaria política do início do primeiro mandato, mas também os empresários, os sindicatos e a sociedade em geral.

Ele não vê a menor possibilidade de se concretizarem algumas previsões segundo as quais Lula reeleito, principalmente no primeiro turno, tenderia a tentar repetir seu colega venezuelano, Hugo Chávez.

Mercadante ri quando se fala na hipótese da via autoritária. Primeiro, porque Chávez tem uma situação específica, pois tem dinheiro sobrando do petróleo para fazer o populismo que quiser.

Em segundo lugar, o senador acha que a sociedade brasileira simplesmente não absorveria nem permitiria a implementação de projetos de natureza autoritária.

"Aqui só passa o que é socialmente aceitável." Aponta como exemplo de sinal equivocado de que Lula pretenderia dispensar as instituições para governar direto com as massas a proposta de convocação de uma Constituinte exclusiva para fazer reforma política.

"Não foi aceita a proposta, principalmente porque Lula não faria nada sem passar pelo Congresso e o Congresso não aprovará a instituição de um poder paralelo ao seu. Mas levantar o assunto foi importante para mostrar que Lula está empenhado na reforma política."

Esta, na concepção de Mercadante, virá de qualquer maneira, até por conta da redução do número de partidos resultante da norma que só dá direito à sobrevivência no Parlamento àqueles que tiverem 5% da votação nacional.

Para ele, isso facilitará a relação do presidente com o Congresso, permitirá a "elevação do padrão" dessa convivência e propiciará a melhoria do "diálogo".

O ideal, diz Mercadante em seu imenso otimismo, seria uma coalizão entre PT e PSDB.

Mas, acrescenta, recorrendo a boa dose de ponderado realismo: "O problema é que essa aliança teria obrigatoriamente de dar certo. Se não desse, o fracasso abriria espaço espaço para o populismo."