O que esperar de sua gestão e outras
observações sobre a candidata que
mais subiu nas pesquisas
Vai ser a maior vitória da calça jeans e do rabo-de-cavalo em todos os tempos. Talvez ela também calce um par de tênis ao subir a rampa do Palácio. No discurso de posse, atacará os "parasitas do Banco Mundial" e os "gigolôs do FMI". Investirá contra os "delinqüentes da política nacional" e os que se lambuzam no "vergonhoso balcão dos negócios sujos". Alguns estarão presentes. Balançarão a cabeça, em sinal de aprovação. Dirá que em seu governo não haverá lugar para "gente falsa, cínica". Lembrará que, "em gente ordinária", ela "vomita em cima". Alguns desviarão ligeiramente a cabeça, como a desviar-se de algo que cai do alto. Sorrirão em seguida.
No dia seguinte, a Bolsa de Valores de São Paulo fechará em baixa de 82%. O novo ministro da Fazenda, Bruno Maranhão, dirá que esse efeito já era esperado. No mesmo dia, anuncia-se a revogação das privatizações. A das telefônicas será a primeira. Consumada, o efeito imediato é 80% das linhas amanhecerem mudas. A ministra das Comunicações, Luciana Genro, dirá que é melhor assim: a população voltará a se comunicar pessoalmente, com efeito sem dúvida benéfico para as relações humanas.
A inflação dispara. Em três dias, atinge os 250%. O governo decreta o congelamento de preços. Os gêneros alimentícios desaparecem dos mercados. O governo ameaça apreender bois no pasto. Donas-de-casa saem às ruas batendo panelas. Do lado oposto, a frente "estudantil camponesa" pede a radicalização do processo. Um de seus expoentes, João Pedro Stedile, chefe do "Movimento Pol Pot pela Revogação dos Costumes Burgueses (Mopopo)", reclama a transferência da população das cidades para o campo. Falta gasolina. Cessam as atividades, uma a uma.
Reúne-se o ministério. Uma ala pede a imediata abolição da propriedade privada, o desmanche das instituições burguesas, a prisão dos inimigos do povo e o justiçamento dos recalcitrantes. A questão é debatida durante dezessete horas. Chega-se afinal à conclusão de que não há condições objetivas para tais providências. "Que outras opções temos?", pergunta a presidente. O ministro Babá, da Casa Civil, diz que só vislumbra duas alternativas. "Uma é a renúncia", começa. A presidente faz cara de espanto. "E a outra?" Babá respira fundo, hesita. "A outra", diz, enfim, baixinho, "a outra... é pagar mensalão". A presidente fecha os olhos e afunda na cadeira, desalentada.
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O crescimento da senadora Heloísa Helena na pesquisa do Datafolha, de 6% para 10% das preferências, tem aspectos curiosos. Ela cresceu com força nas regiões Sul (de 6% para 13%) e Sudeste (de 7% para 11%). Ou seja, deu uma arrancada na metade mais rica do país. No Nordeste, onde tem sua origem, cresceu pouco (de 5% para 7%). Heloísa Helena possui 8% da preferência dos eleitores com renda familiar até dois salários mínimos (700 reais). Entre os que ganham acima de dez salários (3.500 reais) fica com porção bem maior – 14% –, o que confirma que faz mais sucesso entre os bem de vida que entre os pobres. E, se alguém acha que seu eleitorado se identifica com a pureza socialista encarnada pela senadora, então veja isso: 39% de seus eleitores dizem que optarão por Alckmin, caso se vejam na contingência de mudar de candidato, e 21% por Lula. Isso é que é eleitorado eclético. A senadora mais parece herdeira do Enéas do que dos desencantados com o PT. "Meu nome é Heloísa Helena!!!"
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Ninguém no mundo político exibe tanta raiva quanto Heloísa Helena. "Vigarice", "mentira" e "estelionato" são palavras que lhe brotam dos lábios com a facilidade com que de outros brotam "bom dia" e "obrigado". O fervor de cruzada que lhe embala a pregação embute a perigosa sugestão de que só ela é honesta e só sua verdade conta. A raiva a faz parecer tão religiosamente ideológica quanto um radical islâmico. E no entanto... No entanto, Heloísa Helena é também um poço de afeto. Seu sorriso é aberto, em certos momentos ela faz uma carinha de criança. As lágrimas lhe vêm fácil. Na crise de sua expulsão do PT, chorou mais de uma vez.
Essas palavras foram publicadas por este autor, neste mesmo espaço, três anos atrás. Vinham a propósito de um programa Roda Viva com a senadora. Como sempre, ela se apresentou como campeã da justiça e da decência. No entanto, não foi capaz, naquele programa, de condenar o regime de Cuba, que acabara de impor punições a um punhado de dissidentes. O texto lembrava também que a senadora aplicava o adjetivo "burguesa" quando se referia à Constituição, o que sugeria desprezo pelo estado de direito, e concluía: "Heloísa Helena é muito simpática quando não está com raiva e às vezes até quando está. Com certeza é excelente amiga de seus amigos. Mas não dá vontade de viver no país que ela tem em mente".
A reação da senadora foi telefonar para dizer que o autor do texto seria bem-vindo no país que ela imagina. Heloísa Helena é uma fera.... Mas Heloísa Helena é fofa.