Editorial |
O Estado de S. Paulo |
24/7/2006 |
A Petrobrás planeja investir US$ 87,1 bilhões entre 2007 e 2011, e desse total US$ 75 bilhões serão aplicados no Brasil. A indústria nacional deve preparar-se para fornecer os equipamentos e materiais necessários aos projetos, avisou o presidente da empresa estatal, José Sérgio Gabrielli, em palestra na Federação das Indústrias do Rio de Janeiro. De outra forma, segundo advertiu, será difícil atender ao objetivo de reservar dois terços das encomendas para fornecedores brasileiros. As empresas deverão estar prontas para participar do suprimento já em 2007 ou 2008, explicou, porque a Petrobrás não pretende atrasar a execução do novo plano de negócios. A intenção é elevar a produção diária de gás e petróleo para 2,92 bilhões de barris no Brasil e 568 mil no exterior. Ninguém pode acusar a diretoria da Petrobrás de insensível aos interesses da indústria nacional. A empresa recorre tradicionalmente a fornecedores brasileiros e, nos últimos anos, voltou a dar tratamento preferencial a estaleiros nacionais, dando-lhes uma chance de recuperação. Mas a empresa tem como função primordial a exploração de fontes energéticas e não pode comprometer sua eficiência nesse campo. Além disso, sendo uma companhia de capital aberto, não pode menosprezar os interesses dos acionistas. Se o fizer, deixará de cumprir sua missão estratégica e violará uma regra essencial do mercado de capitais. Seria um erro interpretar as palavras de José Sérgio Gabrielli como ameaça ou pressão. Seu aviso é principalmente um lembrete, muito útil quando o País precisa, mais do que nunca, de uma bem definida política de competitividade e de inserção internacional. O presidente da República declara-se empenhado em trabalhar pela conclusão da Rodada Doha de negociações comerciais. Ao mesmo tempo, o governo se revela incapaz de formular uma estratégia ampla e pragmática de acordos de comércio. Além disso, Brasília ainda não conseguiu traduzir em ações coordenadas e eficientes o compromisso de executar uma política industrial. Sem articulação e sem liderança para execução de um projeto, o governo tropeça em pequenos obstáculos por falta de uma bem definida pauta de prioridades. Um bom exemplo das dificuldades está no noticiário dos últimos dias: para não perder R$ 200 milhões de receita da CPMF, o Ministério da Fazenda atrasa a minirreforma do sistema cambial. Em todas as frentes há pouco ou nenhum avanço. Custos administrativos e alfandegários acrescentam até 20% aos preços de exportação, segundo estudos mencionados pelo professor Otaviano Canuto, representante brasileiro na diretoria executiva do Banco Mundial. A lista de ações com potencial de redução de custos é enorme e inclui os investimentos para ampliação e modernização da infra-estrutura. Esses investimentos são emperrados por falha de gestão, por critérios fiscais inadequados pelo atraso na implantação das Parcerias Público-Privadas (PPPs). Do lado empresarial, volta a crescer a resistência a compromissos comerciais que impliquem abertura de mercado. Os empresários têm razão quando mencionam as desvantagens decorrentes dos impostos excessivos, do financiamento escasso, da burocracia invencível, do câmbio valorizado e de outras deficiências materiais e institucionais. Mas a atitude meramente defensiva não será uma solução. Os competidores mais pragmáticos e determinados continuarão a ocupar espaços no Brasil e no exterior. A valorização cambial seria um obstáculo muito menos importante se uma bem definida política de competitividade fosse eliminando os vários focos de ineficiência da economia nacional. O lembrete de José Sérgio Gabrielli aos empresários brasileiros é também um desafio. Mas esse desafio vale tanto para o setor privado quanto para o governo. Não basta o presidente Luiz Inácio Lula da Silva recomendar à estatal que dê preferência ao fornecedor brasileiro. Uma política desse tipo será mais prejudicial para a Petrobrás do que benéfica para a economia brasileira, se não se criarem condições para os fornecedores nacionais ganharem competitividade real. A Petrobrás não pode ser uma ilha de modernidade e eficiência. |