terça-feira, julho 25, 2006

Dora Kramer - Relator leva tensão à CPI




O Estado de S. Paulo
25/7/2006

Depois de perder prazo no mensalão, Lando tenta esfriar comissão dos sanguessugas

Quem quiser pode considerar tudo mera coincidência. Inclusive é assim que, oficialmente, as sistemáticas tentativas do relator da CPI dos Sanguessugas, senador Amir Lando, de "esfriar" os trabalhos são classificadas pelos companheiros de comissão - frutos do acaso, excesso de zelo talvez.

Extra-oficialmente, porém, há implícita crença na existência de algo mais que aviões de carreira no fato de Lando - presidente da CPI do Mensalão, a única da crise a encerrar seus trabalhos sem relatório, por causa de uma alegada perda de prazo - toda segunda-feira se dedicar ao exercício do anticlímax dando entrevistas que, ao longo do dia, precisam ser desmentidas por ações de outros integrantes da CPI.

Como Amir Lando é indicado do PMDB para ocupar a relatoria e depende do partido na campanha para governador de Rondônia, suspeita-se fortemente que esteja sendo pressionado pelo comando de seu partido, cujo filiado mais proeminente no Congresso é o presidente do Senado, Renan Calheiros, um adversário explícito da instalação da CPI dos Sanguessugas.

Na semana passada, Amir Lando protagonizou o noticiário da segunda-feira de manhã dizendo em todos os jornais que a CPI não teria como apresentar relatório parcial em agosto porque, segundo ele, os trabalhos estavam "muito atrasados".

Justamente naquele fim de semana a CPI anunciara disposição de negociar com o Supremo Tribunal Federal a divulgação dos nomes dos parlamentares alvos das denúncias do Ministério Público de Mato Grosso e personagens do depoimento do empresário Luiz Antônio Vedoin à Justiça do Estado em sistema de delação premiada.

O balde de água fria de Lando causou espécie, mas não espanto. A reação imediata de seus colegas Antônio Carlos Biscaia, o presidente, Raul Jungmann e Fernando Gabeira foi anunciar que os 57 nomes seriam divulgados e que não só seria concluído um relatório parcial na primeira semana de agosto, como até o dia 16 sairia mais um com o restante dos nomes dos acusados.

Naquela altura, uma semana atrás, eles eram 57. Dias depois a lista subiu para 112, o presidente da CPI anunciou que a suspeita atinge todo o Congresso, no fim de semana a revista Veja revelou mais nomes e informações contidos no processo e na segunda-feira, ontem, eis que outra vez Amir Lando aparece no noticiário de balde e água gélida em punho.

Deu diversas entrevistas dizendo que a lista seria aquela anterior dos 57, que não pretendia notificar os outros apontados e apresentando aquelas já conhecidas justificativas a respeito da necessidade de não ampliar o universo dos investigados para "não perder o foco".

Ora, foco se perde quando se quer. Como ocorreu no caso da CPI do Mensalão presidida por Amir Lando e relatada pelo deputado Ibrahim Abi-Ackel. A despeito de longevos no Congresso e experientes na vida - ou vai ver por causa disso mesmo - perderam o prazo regimental e a CPI terminou sem relatório. Logo ela, criada para investigar a principal denúncia feita por Roberto Jefferson.

Em suas entrevistas desta segunda-feira, Amir Lando considerou que o envio de notificação para apresentação de defesa de todos os 112 parlamentares era desnecessária porque, em alguns casos, as provas "cabais" justificariam o envio direto ao Conselho de Ética.

E qual o problema de notificar?

Para o investigador, nenhum. Ao contrário. No caso da CPI dos Sanguessugas é essa notificação que permite a divulgação, pois funciona como uma espécie de "licença" à quebra de sigilo imposta pela Justiça ao processo.

Além disso, se não forem notificados a apresentar defesa, mais à frente alegarão - como fizeram no caso do mensalão - terem tido seus direitos cerceados. Quer dizer, os argumentos do relator não têm lógica do ponto de vista de quem investiga, embora façam todo sentido sob a ótica dos acusados.

Taticamente, os integrantes da CPI não impõem, de público, reparos à conduta de Amir Lando, muito embora o desautorizem na prática.

Ontem mesmo, trataram de desmenti-lo quanto às notificações e à intenção de reduzir a lista. O sub-relator Carlos Sampaio anunciou que até sexta-feira deixará os 112 nomes "prontos" para serem notificados e o vice-presidente, Raul Jungmann, tratou de dar publicidade à existência de provas a respeito de 80% dos citados.

Eles só não serão notificados se o relator não quiser. E aí, de novo, de alguma forma será levado a recuar. A palavra final sobre os trabalhos da CPI não é dele; é do presidente Antônio Carlos Biscaia ou do plenário.

Ainda que considerem melhor não confrontar Lando, dentro da lógica do ruim com ele pior sem ele, os parlamentares que conseguiram viabilizar a CPI contra todas as expectativas não pretendem se deixar arrastar ao descrédito por causa da pressão do PMDB e de outras instâncias interessadas em parar as coisas por aqui. Se o preço for o Congresso descer mais alguns degraus, para a turma do deixa disso moral sai mais barato.