sexta-feira, junho 23, 2006

Dora Kramer - Quanto mais discreto, melhor

O Estado de S. Paulo
23/6/2006

O episódio da videoconferência que acabou rendendo indesejada
desinteligência com Ronaldo camisa 9 serviu de lição e, no que
depender dos conselhos da assessoria, o presidente Luiz Inácio da
Silva nem passará perto da Copa do Mundo, mesmo se o Brasil chegar à
final.

Dias antes da final, Lula estará em São Petersburgo, na Rússia, para
a reunião do G-8, e está sendo aconselhado a se concentrar nas
discussões sobre Organização Mundial do Comércio e matrizes
energéticas e deixar atividades presidenciais ligadas à disputa do
mundial de futebol para uma possível vitória do Brasil.

Nesse caso, Lula fará as homenagens cabíveis ao chefe de Estado do
país-personagem mais destacado do evento de maior repercussão no
mundo, onde o futebol é mais que um esporte, na volta da seleção ao
Brasil.

Fará as honras da casa mesmo se o time perder; mas, ganhando, a
recepção será festiva com direito a condecoração e tudo o mais.

Argumenta-se no Palácio do Planalto que até governantes de relações
não tão apaixonadas pelo futebol, como Fernando Henrique Cardoso, têm
por dever de ofício dar à Copa do Mundo a dimensão nacional e
internacional do evento e da posição do Brasil no campeonato.

Lula, então, um aficionado, por mais razão vai patrocinar
comemorações à altura. O ideal, segundo sua assessoria, é que
encontre um ponto de equilíbrio entre a participação e a prudente
distância que distingue entusiasmo de torcedor e missão institucional
de presidente da tentativa - e de qualquer gesto que possa ser
interpretado assim - de se aproveitar politicamente do sucesso do
futebol.

A videoconferência, é claro, a assessoria presidencial não diz que
foi um exemplo desse tipo de tentativa malsucedida.

Na versão palaciana, foi só uma forma de o presidente desejar boa
sorte à seleção.

Há concordância, porém, com o fato de as coisas terem saído bem pior
que a encomenda: a resposta mal-educada de Ronaldo ao presidente e a
divulgação da proibição de os jogadores fazerem perguntas a Lula
realmente não estavam no programa.

Portanto, a preferência no palácio é quanto menos risco melhor. E o
figurino discreto, outra vez se dependesse apenas da racionalidade
das estratégias, seria estendido para a campanha à reeleição.

Há no governo muitas queixas em relação ao tom agressivo assumido
pelo PFL nos ataques até pessoais ao presidente. Os assessores de
Lula não esperavam dos adversários tanta belicosidade porque deixa
menos espaço ao governo para pôr em prática o seu plano de discutir
realizações e comparações com a administração do antecessor.

Oficialmente, o Planalto desenvolve o raciocínio de que a ofensiva
pesada acabará rendendo maus frutos à oposição, porque o eleitorado
tenderia a rejeitar a "baixaria".

Na realidade, porém, reconhece-se que a violência verbal é mais
prejudicial ao governo. Além de ter muito mais a perder, Lula é
presidente e, nessa condição, fica muito mais exposto a críticas caso
cometa alguma grosseria, mesmo como revide.

Já à oposição quase tudo é permitido em matéria de falta de
cerimônia. Nota-se claramente no governo o desejo de que a imprensa
comece a impor reparos ao estilo do PFL, de modo a inibir o "joelhaço".

Na avaliação do Palácio do Planalto, o ambiente também se configura
hostil pelos lados da Justiça Eleitoral. O nome do presidente do
Tribunal Superior Eleitoral, Marco Aurélio Mello, é citado
diretamente quando se fala em rigor e endurecimento da fiscalização.

Não se ousa insinuar motivação política nas ações do ministro Marco
Aurélio, mas é nítida a preocupação com a atuação dele durante a
campanha.

O veto à campanha de divulgação do novo número de teleatendimento do
INSS durante o período de proibição de propaganda institucional foi
considerado particularmente rigoroso, fora de propósito até.

Então, como enfrentar o clima animoso?

No papel, a receita é divulgar realizações, procurando fazer isso da
forma mais amena possível. Mas na prática ninguém sabe até que ponto
o presidente Lula conseguiria daqui para a frente resistir às
provocações da oposição, já que até agora o reflexo de responder de
bate-pronto tem prevalecido sobre o desejado, mas nem sempre adotado,
figurino "paz e amor".

Provocação
Se a Advocacia-Geral da União tem, como disse em nota divulgada
ontem, certeza de que o governo não feriu a Lei Eleitoral ao editar
medida provisória dando aumentos a servidores, por que o Planalto
mandou um deputado do PMDB do Amazonas consultar o TSE a respeito?

É cada vez mais forte a impressão de que o governo puxa briga com a
Justiça na preliminar a fim de desgastar eventuais decisões
desfavoráveis em momentos decisivos.

Debates
A assessoria do presidente não sabe informar se ele vai ou não a
debates na campanha. Em 1998, Fernando Henrique Cardoso não foi.