O GLOBO
Não deixa de ser alarmante que dois anos depois de se instalar no Brasil com estrondoso sucesso, o site de relacionamento Orkut não atraia apenas quem procura fazer amigos. Ele se transformou também num perigoso instrumento do crime, servindo para vender drogas e armas, e para promover a pornografia infantil, oferecendo crianças à exploração sexual, entre outros atentados aos direitos humanos, como o racismo.
Fica-se sabendo na própria internet que o Brasil é o quarto país no ranking mundial em sites destinados à pedofilia. Há "Clubes de pedófilos" que reúnem sócios de vários países num negócio que movimenta milhões de dólares. É também o paraíso do narcotráfico. São muitos os leilões para compra de ecstasy e os links de endereços estrangeiros para remessa pelo correio de entorpecentes e alucinógenos. Um certo "Ecstasy-BR" tem mais de 5 mil participantes e oferece comprimidos a R$ 30,00. Um Orkut na Argentina vende caixas de lança-perfume com doze ampolas por R$ 139,63. A encomenda é entregue em casa em 72 horas.
Esta semana mesmo no Rio, um garoto de 16 anos confessou à polícia ter criado uma comunidade para cometer crimes, influenciado pelo MC Colibri, o funkeiro de quem é fã e que foi preso por tráfico de drogas.
Por tudo isso o Orkut é hoje um alvo do Ministério Público, que já intimou a empresa responsável — o Google, com matriz nos EUA — a fornecer dados e quebrar o sigilo das comunidades virtuais criminosas. A intimação se baseou na denúncia de uma Ong que em dois meses recebeu mais de 20 mil queixas de crimes cometidos no Orkut.
Ao contrário de sua atitude obediente na China, onde aceitou disciplinadamente as regras do jogo, ou seja, as medidas de censura impostas pelo governo comunista, aqui a empresa tem resistido a acatar ordens judiciais, dificultando o trabalho de investigação da polícia e do MP. Alega que as informações pedidas estão hospedadas no Google Inc., com sede na Califórnia, e que o Google Brasil "não tem a menor condição de prestá-las, diante do simples fato de não as possuir". Quer dizer: é como se fossem duas empresas estranhas que não pudessem sequer trocar dados e informações. Os procuradores da República que tratam do caso consideraram "inválidas" as alegações. "A Microsoft e a Yahoo! também utilizam servidores internacionais e, quando solicitadas, não se recusam a colaborar", disse um deles.
Evidentemente, não se pode pensar em impor censura ou retirar do ar um instrumento de aproximação das pessoas como o Orkut. Mas é também indesculpável que o Google se deixe usar como agente passivo da criminalidade virtual. Já temos isso demais no mundo real.