O GLOBO
O candidato presidencial Geraldo Alckmin, do PSDB, propõe um choque de gestão. Refere-se, naturalmente, à hipertrofia do Estado, à ineficiência e à corrupção reinantes na máquina pública. O presidente Lula, do PT, rebate propondo, alternativamente, um choque de inclusão social. Refere-se evidentemente aos programas de políticas públicas que exibe em comparação com o governo anterior. O debate contém uma armadilha e uma oportunidade, dependendo de como seja conduzido.
A armadilha consiste em ficarmos restritos ao tosco modelo social-democrata, que aprisiona o país com duas décadas de baixo crescimento. A grande premissa social-democrata é que o Estado é o responsável pela inclusão social. A premissa fundamentou a arquitetura tucano-petista, que, em sucessivos governos desde a redemocratização do país, em 1985, empurrou os gastos públicos de 20% para 40% do PIB.
O debate restrito aos limites da social-democracia tornou-se uma falaciosa escolha entre ajudar os pobres (choque de inclusão) ou erradicar a corrupção e a ineficiência do Estado (choque de gestão). Esse seria um debate desalentador, com o desfecho previsível de manter o país andando em círculos.
A oportunidade surge com a possibilidade de ampliação dos limites do mapa cognitivo da social-democracia. Em suas primeiras entrevistas, o candidato Alckmin trouxe alguns pontos extremamente relevantes para reflexão. Primeiro, falou em reforma política. É inadiável que o Poder Executivo tenha como interlocutores os partidos políticos, com mandato de representar os parlamentares por meio da fidelidade partidária. O país ganharia com a tramitação de reformas fundamentais facilitada pelo diálogo, e não pela relação direta do Executivo com cada deputado e senador.
Em segundo lugar, o candidato oposicionista abordou a reforma fiscal, o que poderia significar a imprescindível descentralização de recursos e atribuições para estados e municípios. O terceiro ponto relevante trazido ao debate por Alckmin é o choque de capitalismo: o reconhecimento de que a maior máquina de inclusão social que a Humanidade já descobriu são as economias de mercado.
Com essa perspectiva, o candidato Alckmin teria condições de aceitar o desafio dos choques de gestão e de inclusão social simultaneamente. Estaríamos nos aproximando de uma plataforma liberal-democrata, que combina o profundo respeito pelas virtudes das economias de mercado (herdadas dos liberais clássicos ingleses do século XVIII) com o sólido compromisso com os indivíduos que os mercados deixaram para trás (a solidariedade herdada dos modernos liberais americanos do século XX).