quarta-feira, maio 31, 2006

Míriam Leitão - Tempos piores





Panorama Econômico
O Globo
31/5/2006

É o tempo da incerteza. A cada dia, tem uma boa explicação para a dúvida, a alta ou a queda dos mercados. Não importa a explicação nossa de cada dia; está claro que o mercado mudou. "Nos últimos três anos, na ausência de notícia, o mercado subia; hoje, na ausência de notícia, ele cai", diz o economista Ricardo Amorim, do WestLB. Hoje haverá muita notícia aqui e lá fora.

A notícia do PIB só influencia se for ruim. Se for boa, a avaliação será de que aconteceu o que se esperava. O mercado está com a expectativa de um PIB brasileiro do primeiro trimestre em alta.

A decisão do Copom só sairá de noite, quando for tarde para influenciar. O fator mais importante será a ata do Fed sobre a última reunião.

— Será uma espécie de superquarta-feira: várias notícias sairão ao longo do dia tanto aqui quanto lá fora: PIB, Copom e Fomc — comenta o economista Luiz Roberto Cunha, da PUC

Ricardo Amorim, de Nova York, lembra que, na quinta-feira e na sexta-feira, também sairão dados importantes sobre o mercado imobiliário americano que podem esclarecer se haverá, ou não, uma queda nos preços dos imóveis e uma redução do consumo.

— A curto prazo, a volatilidade é uma das poucas certezas da economia — diz Ricardo Amorim.

O mercado fica de olho em cada indicador dos vários que saem semanalmente nos Estados Unidos. Trata todos com a mesma ansiedade, como se cada um fosse decisivo para tirar as dúvidas que pairam sobre a avaliação da conjuntura.

Na verdade, não há um que dê a resposta final porque o momento é de incerteza, de mudança na conjuntura, de volatilidade. A ata do Fomc vai concentrar a atenção hoje, mas não trará nenhuma resposta definitivamente esclarecedora que previna novas oscilações a curto prazo.

— Não há como ser conclusivo num momento de tanta incerteza — diz Luís Fernando Lopes, do Pátria Banco de Investimentos.

Uma avaliação importante feita pelo economista Ricardo Amorim é que, ao contrário do que se imagina — e do que o Ministério da Fazenda parece acreditar —, a alta do dólar não levará a um aumento das exportações e das receitas em moeda americana das empresas exportadoras. Pode dar exatamente o contrário.

— O real ficará mais desvalorizado, mas o saldo será menor porque a demanda internacional será mais baixa e, conseqüentemente, os preços dos produtos exportados pelo Brasil, menores — avalia.

Nos últimos dias, o BC e o Tesouro tiveram que tomar decisões de época de crise: recomprar papel longo, prometer venda de LFT e ontem operar no mercado de câmbio para segurar o dólar. Até recentemente, tudo isso parecia afastado do horizonte. A evolução recente mostra que, numa economia internacional em volatilidade, não há qualquer cidadela nacional onde se possa proteger do mundo externo.

É com base nisso que o Banco Central vai se reunir para decidir hoje a redução da taxa de juros. A inflação está baixa, mas há uma enorme incerteza sobre a taxa de câmbio.

— A tendência longa de apreciação do real não será mantida nos próximos meses — afirma Ricardo Amorim.

O que ele diz é que há um processo global de desalavancagem que eleva a turbulência:

— Nesse processo, há muita gente querendo vender e não há quem queira comprar.

Por enquanto, não há um cenário parecido com o de 2002, na opinião de Amorim, mas o economista do WestLB acredita que o ajuste da economia do mundo já é, a esta altura, inevitável .

A grande dúvida é se a economia americana, que continua a crescer, vai entrar em recessão.

— Acho que quem está bem preparado para evitar esse risco é exatamente o presidente do Fed, Ben Bernanke, cujos estudos na economia foram centrados nos erros de política monetária que produziram a recessão de 29 — conta Ricardo Amorim.

Ele está convencido de que a queda dos juros a ser anunciada hoje pelo Copom será a última do ano. A conjuntura, segundo ele, não permitiria novas quedas.

Se for isso, a economia brasileira já começaria a pagar o custo da crise.

Responsabilidade racial

Ação afirmativa é muito mais que cota, e vai muito além da universidade. O Instituto Ethos divulga hoje o "Compromisso das Empresas com a Promoção da Igualdade Racial", que conta alguns casos bem-sucedidos de ação afirmativa nas companhias. Uma pesquisa do próprio Ethos, feita com 119 grandes empresas do Brasil, mostra que apenas 3,4% dos cargos executivos e 9% das gerências são ocupados por negros. Ou seja, o poder nas empresas é branco.

Uma das iniciativas: o Instituto Newton Rique, ligado ao Shopping Iguatemi Salvador, está promovendo censos periódicos sobre os funcionários de comércio e uma série de debates sobre como aumentar a presença de negros no comércio de Salvador.

O BankBoston paga a formação de 21 jovens negros de baixa renda. O ABN Amro Real tem um programa para ter mais negros entre seus funcionários. O Itaú contratou, em 2005, 21 alunos de administração da Universidade Zumbi dos Palmares para três anos de estágio e treinamentos. Este ano, serão mais 31 estagiários.

O Ethos incentiva este tipo de ação e lista outras empresas com projetos: Basf, Belcar Caminhões e Máquinas, Cooperforte, CPFL Energia, DuPont e Laboratório Sabin.

Cada um tem um programa, mas o objetivo é o mesmo: aumentar a diversidade no quadro de funcionários.