domingo, maio 28, 2006

Miriam Leitão Fim da semana


O GLOBO

A semana passada foi particularmente nervosa, mas terminou muito melhor do que se imaginava e, de novo, o mercado financeiro oscilou entre o medo e a euforia. Os extremos são sempre desaconselháveis. O mundo está diferente e a economia internacional entrou numa fase de volatilidade. Outros momentos como o da semana que passou podem se repetir nas próximas semanas e meses.

Uma avaliação que ouvi de dentro do próprio governo mostra que, a despeito das declarações tranqüilizadoras de praxe, sabe-se que há uma mudança na economia mundial que a torna menos favorável a nós que nos últimos três, quatro anos. A economia americana, que vinha operando com 1% de juros, aumentando a liquidez mundial e o fluxo de capital para os emergentes, hoje está com 5% e a pergunta que se faz é: quanto mais vão subir?

A resposta dada pelos indicadores divulgados na semana passada é mais positiva do que se achava. Os dados de inflação mostram que ela está no teto da meta informal seguida pelo Fed e os dados de crescimento mostram que a economia americana continua pujante. Há outros sinais, contraditórios, indicando desaceleração do mercado imobiliário e de outros itens da demanda. Por enquanto, o cenário de estagnação com inflação nos Estados Unidos está, felizmente, adiado. Temia-se que o país estivesse com os índices de preços acima da meta e com números de crescimento muito baixos. Isso exigiria do Fed elevação maior dos juros numa economia desacelerando. Uma coisa é uma crise num país periférico contaminando outros, como nos anos 90. Outra é uma crise na economia central. O efeito no resto do planeta seria óbvio.

Houve um tremor que pode se repetir. Há economistas mais ou menos otimistas, mas ninguém duvida que o ambiente de agora é diferente do que presidiu a pujança dos últimos anos. "Não é possível tirar conclusões definitivas sobre a magnitude dos efeitos dessa turbulência, nem sobre sua duração", diz o boletim do Banco Itaú.

O país está melhor agora que em qualquer outra crise. Um dado: as reservas internacionais são hoje 149% dos compromissos externos de 12 meses da economia brasileira. Mas, com a volatilidade, esses dados mudam rapidamente. Em 11 dias, o real se desvalorizou 14%, mesmo sendo o Brasil um país que fez seu ajuste externo, ao contrário da Turquia, por exemplo, com seus 6% de déficit em transações correntes.

O Brasil tem suas fragilidades num sistema político em frangalhos, num governo sem iniciativa legislativa, num superávit primário construído com aumento de arrecadação e não com corte de gastos; pelo contrário, as despesas continuaram crescendo em abril, mesmo que o mês tenha produzido, como foi divulgado, um enorme superávit primário.

Aqui a reação nesta última semana foi mais forte. Isso porque os juros altos fizeram do Brasil o destino favorito do dinheiro de curto prazo. Certos integrantes do governo mostraram-se totalmente despreparados para crises de grande magnitude. A dívida é muito alta e inspira pouca confiança, apesar de tudo. A troca das NTN-Bs, feita na quarta-feira e na quinta-feira, sepultou a idéia de que o Brasil poderia rapidamente se transformar num país normal, com uma dívida alongada e barata.

Por ironia, o Instituto de Estudos de Política Econômica da Casa das Garças lançou na semana passada um livro fruto de muitos debates entre professores e ex-professores da PUC-Rio sobre a LFT. O papel, inventado para que o país pudesse, durante o período da hiperinflação, manter sua dívida sendo rolada, pode ou não ser retirado do mercado? Em torno dessa pergunta, economistas, entre eles os pais do real, dividiram-se. André Lara Resende o defendeu. Outros o atacaram. Ana Novaes, que fez o sumário, admitiu que houve debate demais e consenso de menos.

Com fama de ser o papel que transfere para o governo todo o risco, e que dá vida mansa ao mercado financeiro em momentos de crise, a LFT voltará a ser oferecida, informou o secretário do Tesouro. Já o papel que venceria em 2045 foi recomprado de investidores estrangeiros que saíram rapidamente do país.

Conclusão: o Brasil ainda está longe de ser um país normal e blindado contra as crises. A economia internacional não está em crise, mas o melhor momento passou. E nós não o aproveitamos para criar as condições do crescimento sustentado.