segunda-feira, maio 29, 2006

Inevitável fim do fôlego RICARDO AMORIM

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DESDE O final de 2002, ativos financeiros brasileiros, como Bolsa de Valores, o real e títulos de dívida externa, tiveram o melhor desempenho da história devido a condições externas muito favoráveis. No início de 2001, após o colapso de empresas de internet e o estouro da bolha da Nasdaq, a economia mundial estava frágil. Em resposta, os principais bancos centrais mundiais reduziram taxas de juros para incentivar o consumo. Nos EUA, as taxas de juros chegaram a 1,75%, e no Japão, a 0%! A resposta inicial da economia mundial foi modesta. Em 2001, os EUA tiveram seu mais baixo crescimento desde 1991, só 0,8%, e a economia mundial desacelerou. O preço das commodities caiu para mínimas históricas e surgiram temores de recessão global. Investidores venderam ações e títulos de países emergentes, deprimindo o preço desses ativos. Com a inflação mundial no nível mais baixo da história e a Bolsa de Nova York atingindo em outubro de 2002 sua menor cotação desde 1997, os principais bancos centrais mundiais voltaram a cortar juros em 2002. A partir daí, a economia mundial começou a dar sinais de recuperação, e ações, títulos, moedas dos países emergentes e commodities, a subir. Tendo testemunhado a incapacidade do banco central japonês em reestimular sua economia na década de 90, os bancos centrais continuaram a cortar juros e injetar liquidez na economia até junho de 2003. O remédio funcionou e não causou efeitos colaterais. Em 2004, o mundo teve o maior crescimento desde 74, e a inflação mundial quase não subiu. De lá para cá, o cenário econômico mundial permaneceu praticamente inalterado, com crescimento bem acima e inflação bem abaixo da média histórica. A alta do preço dos ativos era inevitável. Baixas taxas de juros globais incentivavam investidores a buscar retornos maiores em imóveis, ações e ativos de países emergentes, enquanto o forte crescimento mundial e a melhora dos fundamentos econômicos dos países emergentes reduzia o risco desses investimentos. Ações receberam uma enxurrada de investimentos, e a alta dos preços foi enorme. Entre a mínima, em outubro de 2002, e a máxima, neste mês, o índice Bovespa teve alta de mais de 400%. Devido ao fortalecimento do real, o retorno para o investidor estrangeiro, que mede seus resultados em dólares, foi ainda maior: 864%! A alta de preço dos diferentes ativos pelo mundo não foi uniforme, mas o sincronismo dos movimentos foi impressionante, pois as forças motrizes de todos os mercados foram as mesmas: liquidez mundial folgada e forte crescimento global. A maioria das Bolsas, moedas e títulos de dívida externa de emergentes atingiram tanto suas mínimas quanto suas máximas nos mesmos meses: respectivamente, outubro/2002 e maio/2006. Infelizmente, as condições que permitiram esse desempenho acabam chegando ao seu fim. Crescimento acelerado e inflação baixa compõem um coquetel perfeito para investimentos, mas não se sustentam para sempre. Em algum momento, a inflação aumenta e/ou o crescimento cai. Com crescimento acima do potencial de longo prazo, a inflação acaba subindo. Para evitar isso, os principais bancos centrais mundiais vêm elevando os juros desde meados de 2004, reduzindo, gradualmente, o estímulo para investimentos mais arriscados. Se os juros mundiais continuarem em alta, em algum momento, investidores voltarão a preferir ativos de menor risco e venderão ações e outros ativos de risco. Caso não haja outros investidores dispostos a comprar esses ativos, seus preços cairão. É possível que os próximos dados de inflação sejam baixos e que os juros mundiais parem de subir, por um tempo, levando a novas altas das Bolsas. Porém, é inevitável que, em algum momento, provavelmente não muito distante, haja nova elevação de inflação e taxas de juros mundiais -e conseqüente redução de investimentos em ações e ativos de risco- e/ou redução do crescimento econômico mundial -e conseqüente queda na demanda por commodities, exportações de países emergentes e resultados de empresas-, levando a baixas nos preços de Bolsas, commodities, títulos e moedas de países emergentes. Estejam preparados!


RICARDO AMORIM é diretor de Estratégia para a América Latina do WestLB e apresentador do Manhattan Connection.