terça-feira, maio 02, 2006

DORA KRAMER Armadilha do adiamento

OESP

Está provado, os fatos demonstram, mas o PT não se convence: quanto mais varre detritos para baixo do tapete, mais obstáculos cria à sua recuperação dos efeitos das diversas crises. Mal se levanta de uma, em seguida já tropeça em outra e, assim, não sai do lugar. Faz isso às vezes por iniciativa própria, às vezes por não ter outra saída.

Como ocorreu agora, no 13º encontro nacional do partido, que decidiu deixar para depois das eleições a discussão a respeito dos meios e modos de funcionamento da máquina partidária que levaram o partido a figurar numa denúncia do Ministério Público como "organização criminosa".

Analisando o quadro sob a estrita ótica do pragmatismo eleitoral, os petistas não tinham mesmo para onde correr: ou ateavam fogo às vestes, assumindo eles próprios o que está à vista de todos, ou tentavam prosseguir na toada do faz-de-conta, na esperança de negar o mundo real para tirar dividendos de uma realidade virtual.

É uma aposta de risco, principalmente quando confrontada com o passado recente de tentativas fracassadas de esconder o sol por detrás de peneiras.

O eleitor de muito boa vontade pode até entender as razões do partido agora, seis meses antes da eleição e com a campanha em andamento.

Mas, como fazê-lo entender que o partido tenha igualmente fugido dos problemas um ano atrás - quando estourou a última crise - e venha adotando sistematicamente a protelação da solução dos dilemas?

Há quatro anos, para não atrapalhar a eleição de Luiz Inácio da Silva, o PT resolveu que poderia praticar atos contrários às suas palavras do passado sem passar por um processo de autocrítica interno como fizeram partidos de esquerda em diversos países, que adaptaram seus ideais de origem às contingências das transformações do mundo antes de se apresentarem ao eleitorado.

O PT, não. A pragmática direção considerou desnecessário convocar um novo encontro para tentar revogar a decisão tomada em 2001 em favor da "ruptura" com o modelo de política econômica em vigor, e fez um documento de cúpula (a Carta aos Brasileiros) contrário ao que defendia o partido, mas convenientemente aceito pela maioria.

No primeiro ano de governo isso rendeu contestação da esquerda do PT e parte dela terminou saindo, uns por decisão, outros por expulsão. As divergências continuaram latentes e assim estão até hoje, abafadas pela contingência da luta política.

Assim que o governo começou a ter sua conduta ética contestada, por atitudes do PT ou de aliados, a reação imediata foi a da postergação do enfrentamento dessas questões. A autocrítica, a punição e a correção de rumos, ficou estabelecido, eram coisa de "inimigo", inadmissíveis em "verdadeiros petistas".

Conduta levada ao extremo no 13º encontro, onde só se permitiram as exaltações a Lula e as exortações ao confronto. Deu-se a repetição do equívoco de 2002, agora aprofundado. Lá revogaram-se as idéias e aqui extinguiram-se os ideais, tendo o partido oficialmente assumido que os fins (eleitorais) justificam os meios; mesmo os amorais.

Que falta faz...

... Um bom amigo, uma pessoa da família, um assessor com autoridade para dizer a Anthony Garotinho que a idéia de fazer greve de fome para criar um fato lateral às denúncias sobre os meios e modos de financiamento de sua pré-campanha, além de tola é tosca: ou ele sai dessa história doente, ou desmoralizado.

Seus companheiros de PMDB, sejam eles defensores ou detratores da candidatura própria, ontem trocaram telefonemas e eram puro deboche nos comentários a respeito do ato, qualificado de insano.

Como protesto, a greve é inócua por ausência de relação de causa e efeito entre as acusações e as exigências que faz para voltar a comer; como ato político-partidário, não servirá para lhe garantir a indicação do PMDB como candidato a presidente, ao contrário, porque ninguém quer se associar à maluquice; como ação de campanha, contraproducente, pois enterra de vez sua candidatura.

O bom amigo, o familiar amoroso ou assessor consciente teria sido útil a Garotinho não apenas se o impedisse de sair de órbita, mas ao menos se dissesse a ele como aterrissar.

Pecado capital

Mesmo com a fatura da candidatura própria liquidada na convenção do próximo dia 13, o PMDB continua longe de expirar o que o deputado Geddel Vieira Lima classifica como o "pecado capital" do partido.

"Nosso problema não é Itamar nem Garotinho. A questão central é o desrespeito ao resultado das urnas. Concorremos em 2002 em aliança com o PSDB, com a deputada Rita Camata como vice de José Serra, perdemos e não soubemos seguir o que nos disse o eleitor: para ficarmos na oposição e tentarmos voltar ao poder disputando nova eleição. Prevaleceu a vontade dos que só sabem fazer política por dentro do aparelho de Estado em aliança com os poderosos da ocasião e agora estamos nessa situação de não ser governo nem oposição. Vamos pagar o preço."