sábado, fevereiro 25, 2006

Brasil cresce 2,3 % em 2005,metade da média mundial

FOLHA
"VÔO DE GALINHA"

Crescimento fica abaixo do de países emergentes e da região e governo petista mantém média dos anos FHC,a média de crescimento foi a mesma, com a diferença que o tucano enfrentou seis períodos ou de crises internacionais ou de turbulências no câmbio, o que não ocorreu ainda no governo petista.

Juro e crise política fazem PIB subir só 2,3%

PEDRO SOARES
LUCIANA BRAFMAN

DA SUCURSAL DO RIO

MARCELO BILLI
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

A economia brasileira cresceu 2,3% no ano passado, menos da metade dos 4,9% de 2004. As famílias -com um pouco mais de renda em razão da melhora no mercado de trabalho- mantiveram o crescimento do consumo, principal combustível do PIB (Produto Interno Bruto) em 2005. O PIB per capita, que crescera 2,3% em 2004, subiu apenas 0,8% no ano passado. O valor do PIB em reais só sai em um mês.
Uma das principais bandeiras eleitorais da eleição presidencial deste ano, a taxa de crescimento econômico da última década mostra que tanto petistas quanto tucanos fracassaram na busca do desenvolvimento sustentado.
Nos três primeiros anos do governo Lula, a taxa média de crescimento ficou em 2,6%. Nos três primeiros anos (1995-1997) do do primeiro mandato do governo Fernando Henrique Cardoso, a taxa média foi de 3,4%. Mas, na média dos oito anos de mandato de FHC, o Brasil cresceu 2,3% ao ano. Nem Lula nem FHC conseguiram quebrar a tendência de baixo crescimento brasileiro inaugurada nos anos 1980.
Nos últimos dez anos, a taxa média de crescimento foi de 2,2% -período que inclui as duas administrações. A taxa é a mesma para os últimos cinco anos.
No ano passado, juros mais altos e a crise política seguraram os investimentos e contiveram o crescimento da indústria, que também sofreu com a concorrência de importados mais baratos.
O Brasil cresceu pouco a despeito da relativa prosperidade mundial. A Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e Caribe) estima que os países da região cresceram 4,3% no ano passado, enquanto o FMI (Fundo Monetário Internacional) projeta crescimento médio de 6,4% para os países emergentes e 4,3% para a média mundial.
Para o economista João Sicsú, do Instituto de Economia da UFRJ, o "pífio" crescimento de 2005 já era esperado graças à política econômica do governo Lula, que "impede que o Brasil surfe na onda de crescimento mundial."
Ao comparar o desempenho dos governos Lula e FHC, o economista disse que a média de crescimento foi a mesma, com a diferença que o tucano enfrentou seis períodos ou de crises internacionais ou de turbulências no câmbio, o que não ocorreu ainda no governo petista. "O que restringe o crescimento econômico é o próprio governo, com a sua política monetária restritiva num cenário de calmaria internacional."

Juros
Sob Lula, os juros subiram para combater a inflação. A taxa básica (Selic) saltou de 16,3% em média no ano retrasado para 19,1% em 2005. Apesar da alta, as famílias brasileiras consumiram mais: tiveram ganhos reais de renda e o emprego subiu, o que aumentou a massa de salários em 6,8%. O crédito consignado, que reduziu as taxas de juros de parte dos empréstimos, ajudou no crescimento do crédito, que aumentou 38,5% em termos nominais, em ano que a inflação ficou em 5,7%.
Com mais renda e crédito, as famílias puderam manter a alta do consumo, movimento que se repete há nove trimestres seguidos. Em 2005, o consumo, que responde por 55% do PIB, cresceu 3,1%. Já os investimentos não mantiveram o ritmo bom de 2004, crescendo só 1,6% no ano passado.
Acuada pela crise de confiança, pelos juros altos e pela concorrência de importados mais baratos, conseqüência da queda do dólar, a indústria cresceu 2,5%, contra 6,2% de 2004. A indústria de transformação, com maior peso no setor, foi a que cresceu menos, registrando modesto 1,3%. "A indústria foi uma das grandes decepções do PIB", diz Julio Gomes de Almeida, do Iedi.
Igualmente decepcionante foi o desempenho do setor agropecuário, único que vinha escapando sistematicamente da estagnação nos últimos anos. O setor cresceu 0,8% no ano. O cenário, diz a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), é ainda pior do que sugere os números do IBGE. A renda dos produtores, estima a CNA, teve queda de 10%, por conta de quebras de safra, preços mais baixos e dólar barato.
O economista-chefe do BankBoston, José Antonio Pena, mostra-se menos pessimista: "Tem duas maneiras de ver esse número. Se olharmos o dado anual, de fato, foi decepcionante, menos da metade do crescimento do ano passado. Mas, em compensação, se observarmos o quarto trimestre, há razões para otimismo, com uma forte recuperação que se manteve no começo deste ano".
A recuperação no último trimestre -apenas 0,8% em relação ao trimestre anterior- é animadora, segundo os economistas, tendo em vista que no terceiro trimestre de 2005 houve recuo de 0,9% no PIB. O resultado, somado à expectativa de continuidade na trajetória cadente da taxa de juros, traz boas perspectivas para 2006, dizem analistas.

ANÁLISE

O que falta para crescimento sustentável

CAIO MEGALE
LUIZ FERNANDO FIGUEIREDO

ESPECIAL PARA A FOLHA

Ontem o IBGE divulgou os números do PIB de 2005, revelando que o Brasil cresceu 2,3% no ano passado, um número certamente desapontador.
De fato, no início do ano passado, os analistas pesquisados pelo Banco Central esperavam que o país crescesse 3,6%, enquanto o próprio Banco Central tinha uma expectativa mais ousada, de 4%. A performance da economia brasileira fica ainda mais decepcionante quando comparada ao desempenho de outras economias emergentes: nos últimos quatro anos, os emergentes asiáticos cresceram em média 7,7% por ano, enquanto os europeus avançaram 5%. No mesmo período, o crescimento médio do Brasil foi de apenas 2,5%.
Por que o país cresce tão pouco? É possível esperar de 2006 uma performance melhor do que a observada nos últimos anos? É possível alcançarmos o ritmo das demais economias emergentes?
O crescimento medíocre de 2005 tem explicações conjunturais e estruturais. A explicação conjuntural passa pelo fato de termos crescido abaixo do nível considerado "potencial" para nossa economia, que se estima em torno de 3,5%. O problema estrutural é que, mesmo se estivéssemos no potencial, ainda é um nível extremamente baixo quando comparado ao dos demais países emergentes.
Desde 1999, quando o país mudou seu arranjo de políticas macroeconômicas, passando a adotar o tripé "câmbio flutuante /metas para inflação /superávits fiscais primários", vivemos em processo de desinflação. Em outras palavras, estamos constantemente tentando trazer a inflação para níveis compatíveis com o padrão internacional, o que traz o grande benefício de abrir as portas para um crescimento mais equilibrado e sustentado, dado o caráter distorcivo e concentrador de renda da inflação.
Para que isso fosse possível, no entanto, foi necessária a prática de juros reais constantemente acima do "neutro", o que levou o crescimento realizado a ser persistentemente abaixo do "potencial". De fato, trouxemos a inflação de 12,5% em 2002 para 5,7% em 2005, sendo que os últimos números mostram que já estamos correndo na meta de 4,5% de 2006 sob o custo de um crescimento médio anual um ponto percentual abaixo do potencial de 3,5%. Essa constatação traz duas boas notícias: 1) política monetária funciona no Brasil, tal como descrita no livro texto; 2) dado que convergimos para a meta de 4,5%, abre-se espaço para reduzirmos os juros e voltarmos a crescer mais vigorosamente nos próximos anos, possivelmente acima da barreira de 3,5%, uma vez que a inflação baixa e a persistência na condução de políticas econômicas coerentes e responsáveis ampliam o potencial de crescimento do país.


Um ajuste fiscal mais profundo exige expressiva redução dos gastos correntes do governo federal

A questão estrutural é um pouco mais complicada. Apesar de termos avançado muito nos últimos anos, ainda persistem distorções importantes no funcionamento macroeconômico do país, que emperram o crescimento mais forte da economia no longo prazo.
Mesmo com superávit fiscal, nossa poupança doméstica continua espremida por gastos públicos gigantescos de 40% do PIB, enquanto nossos pares emergentes gastam próximo a 25% do PIB. Para financiar esses gastos, taxamos outros 40% do PIB, semeando ineficiência no setor produtivo doméstico.
A participação pesada do governo sufoca o investimento privado, que não consegue superar a marca (baixa) de 20% do PIB. Da mesma maneira, o país não avança no processo de abertura da economia, fazendo política externa populista e de pouco resultado.
Esse quadro é resultado de escolhas que o país vem fazendo ao longo do tempo, mais intensivamente a partir da Constituição de 1988. As decisões no campo da Previdência Social, da legislação trabalhista, dos gastos públicos, da abertura econômica, foram, em sua maioria, na direção de um Estado assistencialista, paternalista, desincentivando o avanço dos ganhos de eficiência e, conseqüentemente, da produtividade. Ou seja, optamos por adotar o modelo mais próximo do "bem-estar social" europeu do que aquele fundado no liberalismo macroeconômico, nos moldes dos países asiáticos campeões de crescimento do mundo moderno.
O último relatório "Doing Business in Brazil", do Banco Mundial (disponível no endereço www.doingbusiness.com), traz números preocupantes, que ilustram essa realidade.

É importante que o próximo governo inicie o processo de reformas tributária e previdenciária

Para começar um negócio no Brasil, são necessários, em média, 152 dias, contra 63 dias da média da América Latina e 20 dias nos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Para fechar o negócio, o brasileiro demora dez anos, contra três anos e meio da média latino-americana e apenas um ano e meio na média da OCDE.
O custo de demissão chega a 165,3 semanas de salário, contra 63 semanas na média da região e 35 semanas na OCDE. Finalmente, para fazermos uma importação precisamos empilhar 14 documentos diferentes, contra 10 documentos da América Latina e 7 dos países da OCDE.
Para mudar esse quadro, é preciso retomar a tão propalada agenda de reformas estruturais. O receituário é amplamente conhecido e discutido, mas sua implementação é mais delicada, principalmente quando o assunto é gasto público: um ajuste fiscal mais profundo exige uma expressiva redução dos gastos correntes do governo federal.
É de igual importância que o próximo governo dê início ao processo de reformas tributária -onde esteja incluída uma efetiva redução da carga- e previdenciária.
A redução dos gastos e da carga de trabalho é urgente, para que possamos abrir espaço para mais eficiência na economia brasileira.
Assim, entendemos que o país está efetivamente próximo ao crescimento sustentável, especialmente agora que estamos prestes a concluir o processo de convergência inflacionária. Os juros reais vêm se reduzindo, e a tendência é que o movimento continue, abrindo espaço para que cresçamos, com estabilidade, acima do limite "cabalístico" de 3,5% ao ano. Os primeiros números de 2006 sugerem esse cenário. No entanto, ainda estamos longe de um crescimento potencial próximo ao dos nossos parceiros do Leste Europeu ou do Sudeste Asiático.
A economia brasileira ainda é bastante ineficiente, e nossas contas fiscais, apesar dos avanços recentes, continuam em trajetória explosiva, com gastos crescendo a 10% em termos reais ao ano.
Assim, não basta a persistência no modelo econômico que vem sendo adotado: uma extensa lista de reformas precisa ser levada a cabo, e esse é o principal desafio ao presidente que assumirá o país em 1º de janeiro de 2007.


Caio Megale e Luiz Fernando Figueiredo são sócios da Mauá Investimentos.