quarta-feira, fevereiro 01, 2006

AUGUSTO NUNES O bloco do PT no País do Carnaval

O País do Carnaval autoriza metamorfoses radicais. Homens usam saias, mulheres improvisam bigodes, setentões se enfiam em calças curtas, crianças vestem fraques. Só que a brincadeira tem prazo de validade: não pode exceder o tempo da festa. E até para a fantasia existem limites. Lula e os figurões do PT parecem ter esquecido as ressalvas.

Abstraída a hipótese do surto de amnésia, resta a alternativa afrontosa: os companheiros imaginam que governam o País dos Idiotas. Desde junho do ano passado, a turma desfila no Bloco dos Pecadores, campeão de vaias no carnaval do mensalão. Neste começo de ano, os companheiros decidiram desmontar o bloco campeão de apupos e fundar a Banda dos Inocentes. Aí já é demais. Até para o País do Carnaval.

Se a banda é nova, o enredo é velho como a esperteza, e merece tanta credibilidade quanto o amor aos pobres declarado a cada discurso por Hugo Chávez. Coerentemente, o lançamento da banda ocorreu em Caracas, sede do Fórum Social Mundial e capital do reino da reencarnação de Simon Bolivar. Panfletos distribuídos por militantes do PT reproduziram a letra do samba. A palavra mensalão não é mencionada.

A crise desencadeada há oito meses é coisa das elites inconformadas com o governo socialista de Lula, diz um refrão. O complô conservador resulta da ojeriza ao povo brasileiro, insiste um verso. Na cantoria da banda, o PT não pecou, não mentiu, nada fez de errado. Faltou espaço também para a diáspora de muitos fundadores do partido, que o tornou mais magro, mais pobre, menos confiável, menos respeitável.

Foi-se o grupo dos que pensavam com independência e olhavam sem viseiras. Esses não combinam com a Banda dos Inocentes. Só rebolam sem constrangimentos companheiros com boa garganta e cabeça ruim. Como a catarinense Ideli Salvatti.

A senadora petista foi sempre um berreiro à procura de uma idéia. Encontrou há pouco tempo a tese de fevereiro: impedir que o nome do presidente da República seja mencionado no relatório final da CPI dos Correios. ''Em hipótese alguma o partido aceitará a citação de Lula'', acaba de gritar Ideli. ''Esse tipo de parcialidade é inadmissível, porque não é acompanhada de provas''.

A discurseira recomenda a contratação de algum assessor competente na lida com palavras. Ideli não é do ramo. Com penosa freqüência, usa expressões que servem apenas como pistas para adivinhar-se o que querem dizer. Esse assessor explicaria, por exemplo, o significado desse ''parcialidade'' infiltrado na frase acima transcrita. ''Denúncia''? ''Acusação''? ''Suspeita''? Deve ser algo assim, já que cobra provas.

O alvo da cobrança é o relator Osmar Serraglio. Há dias, entrevistado pela revista Veja, o deputado do PMDB paranaense antecipou que o nome de Lula aparecerá no documento por ter-se comportado com ''negligência'' antes da crise e durante a seqüência de estrondos. Um presidente precisa ser mais atento aos movimentos dos auxiliares, disse Serraglio.

Sempre com brandura, observou que o pântano dos corruptos não seria tão apavorante se Lula tivesse mantido sob estreita vigilância o universo do poder e seus freqüentadores. Ressalvou que não pretendia sugerir o indiciamento do chefe de governo - o que poderia levar à rota do impeachment. Esse é o conteúdo do trecho reservado a Lula no relatório. Pois nem isso Ideli Salvatti admite. Quer provas.

Que provas? Até as estrelas vermelhas plantadas no gramado do Alvorada souberam da roubalheira institucionalizada. Lula ainda jura que ignorava a sem-vergonhice. Como se não fosse bem mais sabido que vegetais.