quinta-feira, dezembro 22, 2005

Editorial da Folha de S Paulo

LEITURA PARA LULA
 
Se o presidente da República de nada sabia, a leitura do relatório parcial da CPI dos Correios, apresentado ontem, poderá ajudá-lo a conhecer alguns aspectos do esquema de corrupção montado por militantes de seu partido e pelo operador Marcos Valério Fernandes para levantar recursos ilegais e assegurar o apoio de legendas e parlamentares ao governo. Segundo o documento, elaborado pelo relator Osmar Serraglio (PMDB-PR), houve "mensalão" e houve drenagem de recursos de empresas sob controle União.
A CPI confirmou que verbas da Visanet administradas pelo Banco do Brasil abasteceram contas de Valério. O relator apontou "lavagem de dinheiro" no BB e indicou Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing da instituição, como o responsável pelas movimentações. A Visanet adiantou dinheiro para a agência DNA, de Valério, sem que serviços publicitários tivessem sido prestados. Alguns desses adiantamentos foram registrados em notas fiscais falsas.
O relator também reafirmou a existência do "mensalão", sob a forma de pagamentos para partidos da base aliada em datas próximas a votações importantes. De maneira acertada, o relatório não se prendeu à questão irrelevante da periodicidade dos depósitos -se foi ou não mensal. A CPI, aliás, identificou pagamentos semanais a partidos.
O PL, ao qual pertencia o vice-presidente da República, foi agraciado com cerca de R$ 1,3 milhão em diversas parcelas. Constatou-se também que, no mês de maio de 2003, houve uma concentração de pagamentos ao PTB, coincidindo com o ingresso de parlamentares na legenda. Já o fluxo para o PP, partido do "rei do baixo clero", Severino Cavalcanti, foi intenso nos meses de janeiro e fevereiro de 2004 -período em que também se verificou a adesão de novos deputados à sigla.
As conclusões, portanto, tornam ainda mais patéticas as tentativas do presidente Lula de negar a existência do "mensalão", como fez em recentes entrevistas e declarações.
Se há reparos a fazer, eles se referem mais ao que está por ser esclarecido do que aos tópicos apresentados pelo relatório. É de esperar que a CPI utilize o tempo que lhe resta para identificar as demais fontes de recursos, explicar as movimentações financeiras no exterior, precisar a real quantidade de beneficiados e revelar o verdadeiro papel do governo nesse deplorável esquema.