quinta-feira, dezembro 01, 2005

DORA KRAMER De néscios e imodestos

OESP

A arrogância absolutista de Jobim não condiz com a divisão existente no próprio STF As sessões de discussão e votação das sucessivas ações impetradas pelo deputado José Dirceu junto ao Supremo Tribunal Federal mostram que nem a própria Corte tem posição líquida e certa firmada sobre suas prerrogativas em relação a assuntos de natureza político-parlamentar.

Esta evidência, entretanto, não inibe o presidente do tribunal, Nelson Jobim, a prosseguir em sua escalada de manifestações de arrogância absolutista.

Jornada esta ontem levada ao extremo por Jobim, em parceria com Sepúlveda Pertence, ao chamarem de "néscios", "idiotas" e "juristas de ocasião" os críticos de suas posições, notadamente os que divergiram da forma como o presidente contabilizou o empate na sessão da semana passada, quando se iniciou o julgamento do último pedido de Dirceu para suspensão de seu processo na Câmara.

O presidente do STF citou frase de Nelson Rodrigues - "Os idiotas perderam a modéstia" - sem se dar conta de que, em matéria de carência de humildade, ele não seria o professor mais adequado para proferir palestra sobre o tema.

Do ministro Pertence destaque-se o gestual soberbo e o "juridiquês" inacessível à compreensão dos comuns.

Cairia bem, principalmente a guardiões dos direitos coletivos e individuais, a observância de certo respeito às opiniões divergentes. Senão às leigas, para aceitarmos a irritação profissional com a ignorância do senso comum, pelo menos às posições do conjunto dos ministros quando as dúvidas se sobrepuserem às certezas no tribunal.

No caso de agora, esse cenário de incertezas ficou exposto nos vários resultados numericamente equilibrados a favor e contra teses opostas e ganhou reforço ontem na manifestação do ministro Joaquim Barbosa.

Justamente ele - que no início de tudo votou contra a direito da Câmara de processar Dirceu porque à época das acusações ele estava na Casa Civil e não exercia o mandato parlamentar - fez a mais severa crítica à ingerência do Poder Judiciário nos trabalhos do Conselho de Ética de uma das Casas do Poder Legislativo.

Expôs com todos os efes e erres seu desconforto por ser obrigado a participar do que qualificou como "inadequada imposição de bizantinices judiciais a uma casa política".

Segundo Joaquim Barbosa, a aplicação do "vetusto" Código Penal a um processo de natureza política explicaria a dificuldade em que o tribunal se encontrava para decidir.

De fato, dificuldade tal que o presidente da Corte, Nelson Jobim, lançou mão da lógica matemática para possibilitar a decretação de um resultado razoavelmente organizado onde, na prática, reinava a desorganização de conceitos.

Na mesma sessão em que Joaquim Barbosa manifestava sua discordância com a ingerência de um Poder nas atribuições de outro, Celso de Mello defendia posição radicalmente contrária ao dizer, também com todas as letras, que o Conselho de Ética simplesmente feriu de morte a Constituição.

Isso enquanto os outros que seguiram o voto vencedor do ministro Cezar Peluso reconheciam a legalidade dos procedimentos, impondo reparo apenas à inclusão do depoimento de uma testemunha de acusação no relatório final.

No fim, prevaleceu o curso do processo da Câmara sem que as seguidas procrastinações tenham servido de lição democrática sobre os direitos e garantias do cidadão.

Nos últimos dois meses de constantes idas e vindas do Judiciário ao Legislativo e vice-versa, não ocorreu nenhum ganho institucional, relevante ou irrelevante.

Portanto foram dois meses de protelações inúteis do ponto de vista do assunto em questão: o julgamento da perda ou manutenção do mandato do deputado José Dirceu.

No tocante ao processo em si não houve alterações de mérito, mas já não se pode dizer o mesmo do Supremo Tribunal Federal que, por mais que queira ignorar o resultado da pesquisa feita pela Associação Brasileira dos Magistrados, estará distante da realidade se não reconhecer que a posição dos juízes condiz com a opinião corrente na sociedade.

A pesquisa mostra que a maioria dos magistrados considera o STF ineficiente e parcial, submetido aos ditames do Poder Executivo. Há, evidente, uma simplificação de percepção principalmente na questão da independência, mas é isso também o que se ouve nas ruas.

Não há provas, mas tampouco seria uma surpresa se consulta mais detalhada e ampliada nos indicasse que a forma desabrida com que o atual presidente se conduz à frente do Supremo tem relação direta com esse juízo.

Talvez fosse prudente, ainda mais para quem tem pretensões eleitorais, olhar o mundo em volta e admitir a possibilidade de existirem mais que néscios e imodestos para além das paredes suntuosas do Supremo Tribunal Federal.

O apostador

É esquisita a explicação de Duda Mendonça para o depósito de R$ 10 mil feito por ele na conta de Delúbio Soares e encontrado pela CPI dos Correios.

Segundo Duda, foi o pagamento de uma aposta com Delúbio sobre a realização do segundo turno na eleição de 2002.

Se foi isso mesmo, ele perdeu para o tesoureiro porque quis. No documentário Entreatos, sobre a campanha, Duda aparece dizendo a Lula que havia "60% de chance de haver segundo turno e 40% de não haver". Ou seja, apostou contra si.