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Não haverá eleição fácil no próximo ano. O paroxismo da cobertura dos escândalos do governo fez Luiz Inácio Lula da Silva sangrar, mas não morrer. Em contrapartida, deu gás para o aparecimento de um personagem que parecia extinto: a direita raivosa, que havia desaparecido com o fim do "milagre" dos anos 70.
Quando se transforma em superlobista o poderoso Vavá, alguma coisa deu errado. O único feito registrado de Vavá foi ter levado um grupo ligado à Federação dos Hospitais ao Palácio do Planalto, sem avisar o assessor presidencial com quem deveria ocorrer a reunião. Segundo o assessor, Vavá era muito bonzinho, o pleito até que era justo, mas havia um advogado muito impertinente no grupo, razão por que nem cafezinho foi servido. Mas durante alguns dias o poderoso Vavá ganhou espaço digno de um Waldomiro e de um Delúbio.
Há uma tonelada de suspeitas para serem investigadas, inclusive intenções passadas iluminadas pelas informações que surgiram com as CPIs -como a, agora esquecida, medida provisória que legalizaria a atuação dos bingos no país. Mas a cobertura já entrou em ritmo de Vavá. E Lula continua vivo, mesmo sangrando e sem dispor de um projeto de país.
Mas quem tem o projeto? Se a crise cambial não se manifestar no próximo ano, se a conjuntura internacional se mantiver favorável, os erros da política econômica aparecerão apenas após a campanha.
No próximo ano se terá numa ponta Lula, na outra a reedição da aliança PSDB-PFL, algum populista ou conservador correndo por fora, muito ódio acumulado para ser despejado de todos os lados. E um componente novo na história: a volta da direita tosca.
Desde a campanha das diretas, a discussão pública foi atormentada pelo radicalismo infantil da esquerda xiita, pelo maniqueísmo, pelo denuncismo que brotava da aliança entre quadros petistas e procuradores.
Agora, parte da mídia começa a investir em algo inédito na história recente do país: o rancor de uma direita ultra-radical, tão maniqueísta, autoritária e primária quanto a esquerda xiita antes de chegar ao poder. Mas com uma diferença fundamental: o esquerdismo infiltrava-se em algumas redações, no enfoque de matérias, mas não se constituía em opção editorial. Nesse período, o contraponto eram alguns expoentes de uma direita culta.
Agora, na luta pela diferenciação, alguns colunistas e órgãos de imprensa passaram a investir -como opção editorial-, no radicalismo da direita inculta. São uma espécie de Severino Cavalcanti com roupas de grife, o exemplar típico da classe média emergente européia dos anos 20, descrito por José Ortega y Gasset (1883-1955) em sua "Rebelião das Massas".
De Olavo de Carvalho herdaram as fixações, não o brilho. Estão longe do cartesianismo brilhante de um Gilberto de Mello Kujawski, de um Oliveiros Ferreira, de um Miguel Reale. Usam a opinião como arma, com a sutileza de um halterofilista trinchando um frango em restaurante de luxo. Valem-se de estereótipos, da exacerbação do ódio em todos os níveis -seja para atingir um "inimigo" político ou para exprimir mera opção estética. Têm a certeza férrea dos ignorantes.
Entre eles, há alguns talentos genuínos, que brandem o discurso por esperteza. Na maioria, se guiam apenas pelo "feeling" -e aí reside o perigo. Por incultos, respondem intuitivamente a uma demanda dos leitores. E há demanda por ódio, radicalização, simplificação e autoritarismo.
O resultado tem sido a editorialização da notícia, o exercício de um opinionismo autoritário e raso, que choca o público mais sofisticado, o leitor mais instruído, mas soa como música para uma classe média que há pelo menos 15 anos se deleita com linchamentos e catarses.
É esse o clima que se espera nas próximas eleições. Numa ponta, Lula, ferido e sem projeto, mas vivo, indo à forra. Na outra, uma oposição ainda sem discurso e sem projeto, por isso mesmo suscetível de encampar esse discurso do ódio.
Vai ser necessário muito bom senso, a consolidação de pactos em torno de lideranças com idéias e moderação para tirar o oxigênio da radicalização.