domingo, outubro 16, 2005

EDITORIAL DA FOLHA DE S PAULO O RISCO DE COMEMORAR

 Na semana que passou, uma agência internacional de classificação de risco melhorou a nota que atribui ao Brasil -isto é, reduziu o grau de risco atribuído aos títulos de dívida externa do país. A notícia é positiva, porque sinaliza a perspectiva de o Brasil pagar juros menores para rolar sua dívida externa.
No entanto considerar essa melhora de "rating" um atestado de acerto da política econômica brasileira, como chegaram a sugerir alguns analistas, é claro exagero. As agências de risco não são entidades neutras e infalíveis. À véspera da moratória da Argentina, ainda atribuíam ao país risco menor que o brasileiro. A qualidade da política econômica de um país deveria ser avaliada por outros e mais amplos critérios.
Tome-se a capacidade da política econômica de contribuir para o aumento do bem-estar da população, com expansão da atividade, do emprego e da renda, e da melhora na sua distribuição. Sob essa ótica, a gestão do governo federal tem limitações evidentes.
O Brasil se aproveita em medida muito menor do que a grande maioria das nações de uma conjuntura global muito propícia ao crescimento. Há excesso de prioridade no objetivo de reduzir rapidamente a inflação. Há dose alta de miopia e ineficiência na gestão dos recursos públicos, como o novo caso de febre aftosa em Mato Grosso do Sul evidencia.
Os prejuízos que esse descaso com a pecuária de corte trará não constituem caso isolado. Vários outros segmentos sofrem com a combinação de recursos orçamentários restritos e ineficiência no seu uso.
Os investimentos públicos em infra-estrutura de transporte, por exemplo, continuam parcos. No setor energético, para além de inversões do setor público, se fazem necessários investimentos privados cuja viabilização depende de regulamentação e estímulos condizentes. Dada a lentidão na execução dessa tarefa, o espectro de novo racionamento no futuro não está afastado.
Portanto, apesar da melhora do risco nos papéis externos, a escassez de recursos fiscais é real no Brasil; a prática de taxa de juros excessivamente alta a agrava; e o uso ineficiente de recursos não se justifica.