"Nem o futebol escapa". Num Brasil assolado por denúncias de corrupção, esse foi comentário bastante ouvido nos últimos dias, após a revista "Veja" ter divulgado a existência de um esquema criminoso envolvendo árbitros que influía sobre o resultado de partidas para lucrar em sites de apostas. Um juiz que já está preso em São Paulo confessou a armação.
Objetivamente, quem perdeu dinheiro com a fraude foram as duas casas de apostas visadas pela quadrilha. Indiretamente, porém, todos os brasileiros que acompanham o futebol, os clubes e os árbitros não-ligados ao programa de trapaças se sentem com toda razão traídos.
A idéia de que eventos lúdicos ocorrem de acordo com regras livremente aceitas pelas partes é central para o conceito de jogo, a crer na definição do pensador Johan Huizinga (1872-1945). No futebol, uma das normas mais "sagradas" é aquela que reza que o juiz é neutro, não interferindo, a não ser acidentalmente, sobre o resultado da disputa. Sua função é, pelo contrário, a de torná-la tão justa quanto possível. Pode até errar -e de fato erra-, mas não movido pela intenção prévia de prejudicar ou favorecer um dos adversários.
O sentimento de indignação é generalizado. Alguns, notadamente os clubes ameaçados de rebaixamento, falam em anular todo o Campeonato Brasileiro. Trata-se de um exagero. Solução muito mais razoável seria anular e refazer apenas as partidas que, após minucioso exame, permaneçam sob suspeição. Pelo que consta, é uma saída desse tipo que está sendo considerada.
A única arma para combater a corrupção, seja na política seja no futebol, é apurar as responsabilidades e punir os que comprovadamente cometeram delitos. Não permitir a impunidade é o caminho para impedir que fatos como esse se repitam no futuro. E isso, pelo menos ao que parece, está sendo feito nesse episódio.