FOLHA DE S PAULO
ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ ACORDÃO À VISTA?
Parecer sobre cassação de Jefferson deve desconsiderar existência de mesada, diz Ricardo Izar
FÁBIO ZANINI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
LUIZ FRANCISCO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA
O presidente do Conselho de Ética da Câmara, Ricardo Izar (PTB-SP), disse ontem acreditar que será derrubada a tese de "mensalão" com a leitura do relatório pedindo a cassação do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), prevista para hoje.
O parecer, ainda sigiloso, foi feito pelo deputado e relator do conselho, Jairo Carneiro (PFL-BA), e será votado na quinta-feira, a não ser que haja manobras regimentais. Se aprovado, deve ir ao plenário até o fim de setembro.
"Pelas informações de que dispomos até agora, a tese de "mensalão" fica derrubada", disse Izar, ressalvando que ainda podem aparecer "provas irrefutáveis".
Segundo ele, foram comprovados, no entanto, delitos de gravidade equivalente. "É público que houve, no mínimo, financiamento irregular de campanha."
Jefferson deverá ter a cassação pedida com base em denúncia sem provas do "mensalão", do qual falou pela primeira vez à Folha, em 6 de junho, e na admissão de que recebeu do PT R$ 4 milhões não contabilizados.
Com o conselho encampando a tese de que não há o "mensalão" denunciado por Jefferson -pagamento mensal de R$ 30 mil a deputados para que votassem com o governo-, ganha alento a defesa de outros deputados que já têm contra si processos de cassação: Romeu Queiroz (PTB-MG), o líder do PL, Sandro Mabel (GO), e principalmente o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT-SP).
Outros 13 deputados que podem vir a ser processados pelo conselho igualmente ganhariam um argumento de defesa.
José Dirceu
"Nesse caso, a acusação contra Dirceu, por coerência, não pode prosperar", diz José Luiz de Oliveira Lima, advogado dele.
O ex-ministro e deputado federal é acusado por Jefferson de ser o operador do esquema. "Qualquer decisão do Conselho que auxilie na nossa defesa poderá ser utilizada", diz Lima.
Dirceu tem se mostrado eufórico em conversas reservadas com interlocutores. "Como é que vão me cassar se me acusam de "mensalão" e não existe "mensalão'?", tem perguntado o ex-ministro.
A contra-ofensiva para derrubar a linha de José Dirceu já está esboçada. Baseia-se em dizer que a forma como teria sido promovido o esquema irregular de financiamento a parlamentares da base aliada é irrelevante.
"Mesmo na hipótese de não haver "mensalão", o que não está claro, houve comprovadamente coisas bastante graves sob o aspecto da transferência de dinheiro do PT para aliados", diz Gustavo Fruet (PSDB-PR).
Furioso com seu pupilo e relator do conselho, Jairo Carneiro -"Eu sou o responsável pela eleição dele"-, o senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) diz que o relatório não pode dizer que não existe "mensalão".
"Se ele [Carneiro] escrever que não existe "mensalão", está errado. O que ele pode dizer é que ainda não pegou o "mensalão" e dar outro nome: semestralidade, pagamento de propina." Carneiro não falou sobre o assunto.
Para o relator do processo contra Dirceu no conselho, Júlio Delgado (PSB-MG), é preciso saber para onde foi o dinheiro que o PT arrecadou e repassou sem registro. "Qual a diferença entre um deputado que recebeu recursos mensalmente e outro que recebeu para pagar despesa de campanha? Nenhuma. Ambos ficam comprometidos com o governo."
Já Itapuã Messias, advogado de Jefferson, reagiu com ironia. "As evidências são incontestáveis. O que alguns devem estar querendo é um recibo, assinado por um deputado, dando ciência de que recebeu mensalmente R$ 30 mil do governo. Isso dificilmente vai aparecer."