sexta-feira, agosto 26, 2005

Editorial de O Globo Vale a palavra




O depoimento do advogado Rogério Buratti na CPI dos Bingos gerou uma expectativa semelhante à que envolveu a ida de Roberto Jefferson à comissão dos Correios e à passagem do ex-ministro José Dirceu pelo Conselho de Ética da Câmara, no processo de cassação do mandato de Jefferson.

Ex-secretário de Antonio Palocci na prefeitura de Ribeirão Preto, acusado de traficar interesses em Brasília e lavar dinheiro, Buratti foi preso na semana passada, e no depoimento que prestou na sexta-feira ao Ministério Público, em Ribeirão, relatou a suposta existência de um mensalão regional de R$ 50 mil destinado à prefeitura na gestão do ministro da Fazenda.

Paga pela empreiteira Leão & Leão, dona de um contrato de recolhimento e manejo de lixo no município, a comissão iria para os cofres petistas de Delúbio Soares. Apesar dos convincentes desmentidos e dos esclarecimentos dados com a devida rapidez por Palocci, o que diria ontem o ex-secretário, beneficiado pela lei da delação premiada, era uma preocupante incógnita, dada a importância crescente do ministro no fragilizado governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

Mas Buratti, embora tenha repetido a história do mensalão, também reafirmou não ter provas do pagamento da propina, apenas as confidências do amigo Ralf Barquete, secretário de Fazenda de Palocci em Ribeirão, pretenso receptador do dinheiro, e já falecido. Então, é a palavra de Buratti contra a de Palocci. Pela credibilidade do ministro, vale a dele. Some-se a isso que, como Palocci ressaltou na entrevista coletiva de domingo, apesar da extensa investigação conduzida pelo MP, até hoje não há qualquer prova efetiva da participação do ministro no suposto esquema — informação confirmada pelos promotores. O próprio Buratti, com a experiência de também ter sido diretor da Leão & Leão, afirmou nunca ter testemunhado Palocci tratar ou referir-se a esse mensalão regional. Com a principal testemunha do caso morta, não se pode ter dúvidas sobre em quem acreditar.

Mas isso não significa relegar a plano inferior as investigações em andamento. Há, tudo indica, um rico filão a ser explorado pelo MP no relacionamento incestuoso de prefeituras, e não só do PT, com prestadoras de serviço, conhecidas financiadoras de campanhas e de políticos por métodos escusos.