Na semana passada, o presidente Lula passou cinco dias em cima do palanque, onde não deveria estar. O tempo seria mais bem gasto se dedicado a dar explicações ao país e procurar uma saída para a crise. Não é o único que deve explicações ao Brasil. O ex-presidente Fernando Henrique derrapou quando quis dizer que os possíveis erros dos tucanos, se ocorreram, são "coisa da História".
Para o governo, as denúncias de que Marcos Valério também fez transferências bancárias para tucanos durante a campanha do então candidato à reeleição ao governo de Minas, Eduardo Azeredo, vêm bem a calhar; servem para confirmar a tese parisiense do presidente Lula de que "o PT fez o que é feito sistematicamente". Esta é a pior idéia que se pode disseminar: de que são todos inimputáveis porque o crime já se generalizou no país.
O PSDB tem que explicar o que se passou. Os tucanos não podem repetir o que fizeram a semana passada, ao bloquear a convocação de Eduardo Azeredo, e pagar o preço de ver adiada a convocação do ex-ministro José Dirceu. A CPI que um dia foi dos Correios precisa ouvir ambos. Fará bem o senador Eduardo Azeredo se oferecer suas explicações à CPI, como foi noticiado.
O curioso é que a operação de Belo Horizonte está mais de acordo com a versão que se tentou dar para a crise do governo Lula: a de crime eleitoral. Parecem operações de financiamento de campanha não declaradas. Delúbio Soares adoraria que todos acreditassem que foi isso que aconteceu no governo Lula. Mas agora a operação tomou uma dimensão muito maior, mudou de natureza e se generalizou. Os repasses foram feitos fora do período de eleições, favorecendo políticos que não faziam parte da coalizão eleitoral. O depoimento do assessor de José Janene, João Cláudio Genu, é uma confirmação da existência do mensalão. O valerioduto parece um grande canal pelo qual passavam repasses freqüentes para políticos da base, recursos para financiar os crescentes gastos do Partido dos Trabalhadores, além da parte que foi usada, de fato, para pagar dívidas de campanhas. Para o governo, a denúncia em Belo Horizonte torna tudo confortável. Ele pode dizer que apenas herdou uma prática corrupta criada no governo anterior. É falsa essa explicação; se fosse verdadeira, seria insuficiente. Cabe ao PSDB evitar que as coisas se misturem.
A crise política tem soluções políticas e precisa de respostas no campo da política. A economia não virá salvando tudo através de uma tal agenda positiva. Há questões que até podem ser aprovadas, mas não há poção mágica na economia capaz de resolver a crise política.
Que chance tem um pacto negociado por Jaques Wagner com a CNI de eclipsar a visão do grande, robusto e sombrio valerioduto? Nenhuma. Não é raro que empresários neste momento proponham essa coisa chamada "pacto". Quando o fazem, têm uma lista grande de pedidos e nenhuma concessão.
Quando sobe num palanque e responde com bravatas, alfinetadas, meias palavras de sentido impreciso, o presidente Lula está apostando na radicalização. Quando o governo acena com um pacto de agenda positiva, está tentando negociar. Que caminho o governo Lula quer seguir, afinal? Nenhum desses dois é bom. O primeiro, por radicalizar e ser uma campanha eleitoral fora de época. O segundo, por ser o equívoco de achar que, na área econômica, se pode fechar o enorme fosso aberto na área política.
Quando faz movimentos para chamar o povo para a rua, subindo em palanques e barrancos, o presidente demonstra que quer voltar aos que sempre o defenderam. Parte deles está no PT; na ala esquerda do partido, que nunca aprovou sua política econômica. Em plena campanha para que seus 800 mil filiados escolham pelo voto direto os novos dirigentes, o PT hoje é um campo conflagrado. Na semana passada, entrevistei dois candidatos à presidência do partido: Markus Sokol, que é da ala O Trabalho, e Plínio de Arruda Sampaio, veterano militante da esquerda.
Os dois rejeitam a atual política econômica. Querem voltar às velhas idéias arquivadas: moratória da dívida externa, reescalonamento e pagamento seletivo da dívida interna e fim da política de superávit primário. Eles dizem que defenderão o governo Lula se houver ameaça à sua permanência, mas tudo depende do programa para o próximo um ano e meio:
— Por exemplo, se for cancelada a próxima rodada de licitação na área de petróleo, os petroleiros podem querer defender o governo Lula — disse Sokol.
— Vamos defender este governo, mas tudo depende do que o presidente Lula vai propor. Se ele nomear Delfim Netto ministro, não sairemos às ruas gritando "Delfim! Delfim!" Não tem cabimento — disse Plínio de Arruda Sampaio.
Os dois não querem adiamento das eleições internas, rejeitam o cancelamento e não acreditam em candidato de consenso.
— Agora que um lado fez um gol o outro quer parar o jogo? Nem pensar! Vamos pro pau! — disse Plínio, de Fortaleza, onde estava fazendo campanha.
— Há seis meses, estamos preparando estas eleições, que já cumpriram várias etapas, cancelar a eleição é golpe — afirma Markus Sokol.
Se Lula for pelo caminho de chamar movimentos sociais para defender seu governo, terá que fazer concessões na área econômica. Esse caminho não tem volta, é de mais polarização e fracassará. O caminho de inventar uma agenda positiva é cortina de fumaça para esconder a crise. Também não vai longe. O único caminho é apurar o que houve, explicar à população, punir os culpados e não ficar usando truques de retórica e desculpas inaceitáveis para esconder o óbvio. E, se a oposição quer contribuir, a hora é esta: que dê também as devidas explicações.
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