terça-feira, julho 26, 2005

Editorial de A Folha de S Paulo ASSASSINATO EM LONDRES

 São pífias as retratações das autoridades britânicas diante do assassinato do brasileiro Jean Charles de Menezes pela polícia londrina. Em mensagem transmitida no domingo, o chanceler Jack Straw afirmou que, apesar de lamentável, o episódio decorre da "pressão muito intensa sob a qual a polícia trabalha". Já o ministro do interior, Charles Clarke, chegou a afirmar que a atuação da polícia era digna "de elogio e admiração".
Seria de perguntar se as mesmas declarações valeriam caso a vítima não fosse um cidadão de um país do Terceiro Mundo. Mas será que isso seria possível? Até que ponto o componente racista não foi decisivo para dirimir em prol do fuzilamento o "terrível dilema" -mencionado pelo jornal "The Independent"- de um agente que se vê diante de um suspeito de terrorismo dentro de uma estação de metrô?
O estado de tensão das forças de segurança britânicas é justificável. A gravidade dos atentados de 7 de julho, em que mais de 50 pessoas foram mortas, e as tentativas fracassadas de ataque no dia 21 são mais do que o bastante para fazer soar o alerta vermelho. Mas é preciso saber o que faz uma polícia tida como modelo de eficiência cometer uma arbitrariedade dessas proporções.
Segundo as justificativas oficiais, o brasileiro morava num prédio cujo endereço constava de documentos encontrados em uma das sacolas que não explodiram na última quinta-feira. Numa manhã de verão, trajava uma jaqueta pesada sob a qual poderia ocultar explosivos. Por fim, teria corrido em direção à plataforma após ouvir o aviso dos policiais.
Não são argumentos que justifiquem violência tão extrema, até porque o suspeito poderia ter sido detido antes de chegar ao metrô, pois foi seguido desde que saiu de casa.
Não há dúvidas de que o terror impõe desafios de difícil solução. Mas, se a essa altura já se criou uma atmosfera em que uma pessoa inocente pode ser morta com oito tiros pela polícia sem que a sociedade e as autoridades reajam à altura, então ao menos uma vitória aos terroristas já se pode conceder.

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