o globo
De repente, quando a gente estava com a atenção presa em tribulações domésticas, o inesperado aconteceu nos Estados Unidos: por decisão de 12 cidadãos (oito mulheres e quatro homens, se faz alguma diferença) o cantor Michael Jackson foi oficialmente declarado inocente da acusação de ser aquele molestador de criancinhas que há anos aprendemos a execrar.
Há 12 anos, o promotor Thomas Sneddon, de Santa Maria, Califórnia, foi autor da primeira denúncia formal contra o superstar: ele teria molestado um menino em seu rancho — o popular "Terra do Nunca". O processo criminal foi logo iniciado e cedo terminado, quando a suposta vítima aceitou 20 milhões de dólares para calar a boca.
A bolada tirou Jackson do banco dos réus californiano, mas ele se viu condenado, pelo mundo afora, em variados tribunais da opinião pública: só paga uma dinheirama, sentenciou-se, quem tem coisa bastante feia a esconder.
Na corte informal em que paparazzi são meirinhos, a prova válida é aquilo que aparentemente revelam as fotos. Jackson, com seus ademanes e suas roupas, suas operações e seu interesse pela companhia de meninos, nesse tribunal sempre foi condenado. E parecia que também o seria agora na Justiça formal. O segundo julgamento, com o mesmo promotor e uma suposta vítima resoluta e persistente, parecia garantir a confirmação disso. Aparentemente, o queixoso parecia ideal para levar o cantor à fogueira: um adolescente de 15 anos, que sobrevivera a um câncer e acusava o réu de tê-lo molestado diversas vezes dois anos atrás.
Mas o julgamento mostrou que o rapaz tinha chantageado diversas personalidades com sua doença, e era teleguiado pela mãe. Esta gastou seu depoimento, longo e caótico, irritando os jurados com um rol de instruções sobre como deveriam votar.
Quem acompanhasse de perto, sem julgar aparências, poderia deduzir que o promotor Sneddon estava mesmo destinado a perder outra vez. Mas cá fora, longe do tribunal, a gente olhava para qualquer foto recente de Jackson e decretava: "Está condenado. Desta vez não tem jeito."
Pois tinha. Raciocinávamos a partir de antigas convicções e persistentes impressões, inválidas num julgamento formal. Em nossa corte íntima estava denunciada a imagem há anos criada pelo cantor, misturando pelo menos a aparência de pedofilia com uma busca constrangedora de embranquecimento das feições.
Essa opinião certamente continua de pé para muita gente — mas em pé e aos gritos também estará a massa de fãs apaixonados pelo velho ídolo pop (um ancião de 46 anos), caso ele, estimulado pela decisão dos jurados, anime-se a tentar reaver, em novos shows e discos, a sua perdida fortuna. Sem dar satisfações a quem quer que seja sobre seus apetites e prazeres.
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