domingo, maio 22, 2005

Gasto federal com Saúde cai na gestão Lula

Estudo do Ipea mostra que os dois primeiros anos do governo petista tiveram os piores desempenhos per capita desde 1995


FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL

A fila não anda, não há atendimento, o remédio acabou. Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ajuda a explicar a realidade de quem busca o sistema público de saúde brasileiro: o governo federal gastou em 2004 com ações e serviços do setor, por cidadão, R$ 189,5, uma queda de 11% em relação ao valor per capita de 1995, primeiro ano da consolidação do SUS (Sistema Único de Saúde).

Ainda segundo dados do Ipea, órgão vinculado ao Ministério do Planejamento, o primeiro ano do governo Luiz Inácio Lula da Silva, 2003, teve o menor gasto em Saúde per capita desde 1995, R$ 176.

Nesses dois anos de Lula, os valores per capita foram menores do que em todos os anos anteriores, ainda a partir de 1995. Os dados ainda serão publicados.

O Ministério da Saúde afirma que considera o levantamento "válido", mas criticou o índice utilizado para medir o impacto da inflação no período, o IGP-DI (Índice Geral de Preços do Mercado -Disponibilidade Interna), medido pela Fundação Getúlio Vargas (leia texto nesta página).

O índice, no entanto, é considerado por pesquisadores do Ipea, órgão do Ministério do Planejamento, o melhor para medir gastos sociais, por ser mais amplo do que o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), defendido pelo Ministério da Fazenda em um debate recente sobre outro estudo, da Unicamp, que também mostrou queda dos gastos sociais.

O Ministério da Fazenda, procurado, não comentou.

O Ipea faz as avaliações periodicamente, explica o sanitarista Sérgio Francisco Piola, que, com os economistas José Aparecido Ribeiro e Luciana Mendes Servo, realizou o estudo.

O levantamento abrangeu o governo Fernando Henrique Cardoso, que em 1997 obteve um aumento dos gastos à base da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira). Entre o primeiro e o último ano de FHC, também houve decréscimo do per capita federal gasto em Saúde, de 7,5%. No último ano da gestão tucana, o valor foi de R$ 197.

Os técnicos utilizaram os parâmetros do Ministério da Saúde sobre o que é investido em saúde -na conta não entram os gastos com inativos e amortizações de dívida, por exemplo.

Além disso, o ano de 1995 é considerado importante porque é o primeiro da consolidação do SUS -quando os municípios passaram a ter um papel mais importante no sistema, diz o vice-presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde, Áquilas Mendes, que avaliou o estudo.

Nos últimos anos, vem caindo a participação da União no financiamento público da Saúde -e aumentando os aportes de Estados e de municípios. Em 2002, segundo o Ipea, 52,9% dos gastos eram da União, contra 63% em 95. O aumento de recursos públicos gastos na Saúde tem ocorrido à custa dos governos estaduais e municipais. Em 2002, esse valor chegou a R$ 232,4 per capita.

"Em países da América Latina e Europa, a participação de recursos públicos é acima de 70%. O Brasil está abaixo e quer ser um sistema universal [o atendimento é garantido a todos, sem distinguir pobres e ricos]", diz Piola.

O financiamento do SUS será um dos principais temas de simpósio organizado pelo Conselho Nacional de Saúde e pela Câmara dos Deputados no próximo mês.

Ministério afirma que índice usado causa distorções
DA REPORTAGEM LOCAL

O Ministério da Saúde informou que considera o estudo do Ipea válido, assim como outros, mas que o uso do IGP-DI como fator de correção causa distorções.

De acordo com a pasta, há variações grandes por causa da oscilação do dólar. Segundo o ministério, dois parâmetros têm sido utilizados para avaliar seus gastos em saúde: a emenda constitucional 29, que vinculou os gastos federais da Saúde à variação do PIB -e que, segundo a pasta, vem sendo cumprida -, e o percentual do PIB que o ministério gasta em Saúde, que vem mantendo "certa estabilidade". Em 1995, o percentual do PIB aplicado pelo ministério em Saúde era de 1,90%, segundo o Ipea, contra 1,87% em 2004.

O Ipea defende o IGP-DI por ele ser um índice de preços que acolhe não só elementos consumidos pelas famílias como insumos industriais e comerciais. A presença de preços do atacado, no entanto, torna-o sensível à variação de câmbio.
Folha de S. Paulo

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