As notícias boas nunca vêm sozinhas. No mesmo dia em que a Petrobras anunciou a produção recorde de quase 1,8 milhão de barris diários, a Bolívia decidiu aumentar os impostos sobre o gás natural enviado ao Brasil, passando-os de 32% para 50%, e, além disso, decretou, na prática, uma nacionalização branca da exploração do produto naquele país.
Feitas as contas com detalhes e somando outras despesas incidentes sobre a atividade, os especialistas estimam que o custo com impostos vai chegar a 70% -uma carga insuportável ("Bolívia eleva taxas de gás e petróleo para estrangeiros", jornal "Valor Econômico", 18/5).
A dependência atual do Brasil em relação à Bolívia é enorme. Compramos, diariamente, 24 milhões de metros cúbicos de gás que alimentam as indústrias e centenas de milhares de veículos no país, em especial táxis. O aumento aprovado nos afeta em cheio.
A revista "The Economist" prevê uma acentuação nessa tendência de estatizar ou reestatizar as fontes de gás e de petróleo. A Venezuela e a Rússia estão indo pelo mesmo caminho. Depois da Bolívia, a Argentina e o Chile podem se animar a fazer a mesma coisa. No que tange ao petróleo propriamente dito, a propriedade e a exploração do produto já é estatal em vários países ("Oil troubled waters: a survey of oil", "The Economist", 30/4).
O gesto da Bolívia mostrou a fragilidade dos contratos firmados com países que misturam a defesa da segurança nacional com a prática de ideologias nacionalistas exacerbadas. O Brasil não pode facilitar nesse terreno. Por mais rigoroso que sejam os contratos, uma eventual contenda judicial poderá levar décadas para ser decidida. E, mesmo assim, corremos o risco de "ganhar e não levar".
O fato concreto é que as ameaças de falta de energia fóssil -ou aumento exagerado de preços- não se limitam à decisão da Bolívia. Os Estados Unidos dispõem de pouco petróleo. O consumo da China e da Índia aumenta de forma assustadora. Os custos com tanques, oleodutos e transporte para atender à nova demanda sobem de forma incontrolável. Os estudos apresentados na citada revista inglesa antecipam que uma nova crise do petróleo poderá elevar o preço do barril a US$ 100!
É claro que, numa crise desse tipo, o mundo inteiro será afetado, até mesmo os produtores de petróleo. Mas não podemos contar muito com o bom senso de quem mistura economia com ideologia e idolatria. O Brasil tem de perseguir suas próprias metas. Além do grande feito realizado pela Petrobras nesta semana, é imperioso acelerar a exploração de jazidas de gás natural, como é o caso de Mexilhão, Cedro, Canela, SPS-36 e de outras que poderão produzir tanto quanto importamos da Bolívia, com um custo competitivo e com segurança maior.
Não podemos esquecer ainda que a verdadeira segurança vem de uma combinação inteligente de várias fontes de energéticos. E, nesse ponto, o Brasil é privilegiado, porque pode utilizar o álcool, o biodiesel e várias outras fontes de biomassa, além da generosa reserva de água que nos permite explorar por muito tempo a energia hídrica.
Mas não podemos ficar sentados à espera de que algo aconteça por inércia. Temos de agir muito mais depressa para garantir o tão falado e desejado desenvolvimento sustentado.
Voltaremos ao assunto na próxima semana.
folha de s paulo
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