Por Reinaldo Azevedo | PARA CRESCER: reestruturação da Febem requer cuidado permanente, mas princípio está correto |
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A Febem tornou-se um antro de torturadores de crianças e adolescentes. Sucessivos governos têm tentado, sem sucesso, colocá-la sob controle. As variáveis envolvidas nesse tipo de serviço público são muito delicadas. Ali, em parte, lida-se com uma infância conspurcada pela desagregação familiar e pela pobreza e, em parte, com bandidos no limiar da maioridade — adultos o bastante para se organizar no crime e legalmente inimputáveis para responder por eles como deveriam. Dado que a Febem acaba tendo também características de prisão no caso dos infratores, padece de boa parte dos males que acometem os presídios.
Todos sabemos da triste rotina de fugas e maus-tratos. Por isso, estão certíssimos o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e o secretário Alexandre de Moraes ao decidir a substituição em massa dos funcionários da instituição. Não se eliminariam os vícios históricos ali incrustados com medidas paliativas: quantas foram as tentativas até aqui, tantas foram as frustrações. Também está correto o princípio de distinguir, com fronteiras claras e, se possível, incomunicáveis, os agentes responsáveis pela educação dos responsáveis pela segurança.
Alckmin e Moraes deveriam colher aplausos, não é?, incluindo os de entidades e sindicatos que gostam de exibir a sua folha de serviços no terreno dos direitos humanos. Em vez disso, o que diz o presidente da CUT, este impressionante Luiz Marinho, um verdadeiro arquiduque da República Sindical Petista e grão-mestre da ordem dos burgueses do capital alheio? Não só vai à praça pública comandar uma ridícula decretação de greve dos funcionários como saca de seu estoque de retórica partidariamente interessada a acusação de que o governo de São Paulo quer privatizar a Febem. É um acinte contra a sociedade e contra os menores. O sindicato dos funcionários da Febem é ligado à central que ele preside. E esta central, por sua vez, é braço sindical do PT e mera correia de transmissão dos interesses do partido. Jamais o sindicalismo brasileiro foi tão atrelado ao poder federal como agora. A CUT vive de nariz no chão e deve estar com o joelho ralado de tanto se dar ao trabalho da genuflexão. Na quinta, enquanto trabalhadores ligados à Força Sindical e até empresários protestavam contra os maiores juros do planeta, Marinho emprestava sua pança de bom burguês à insegurança pública e, na prática, à tortura de menores ao rejeitar as mudanças implementadas na Febem. Que fique claro e que seja inequívoco: opor-se à reestruturação radical da Febem, com a demissão, sim, dos funcionários — de sorte que nada sobre da cultura que lá vigia —, corresponde, na prática, a defender a tortura, o espancamento, a violência. Outras medidas há no pacote, como permitir a visita constante de mães e autoridades à instituição, buscando a co-responsabilidade da família e da sociedade na reeducação do interno. O plano é irretocável. Cumpre zelar para que seja aplicado, e esta é sempre a etapa mais difícil. E note-se que tudo está sendo feito com presteza, eficiência e sem alarde, justamente para não dar tempo para que a corporação reaja. Especialmente quando essa corporação fala, a um só tempo, a linguagem do crime (sim, proteger espancadores é uma forma de associação criminosa) e a da política. Aliás, esse binômio tem sido a cada dia mais freqüente no país. São muito tênues, no campo e nas cidades, as linhas que têm separado certo sindicalismo do banditismo comum e que têm distinguido os dois de um partido político. Espancador já é chamado de companheiro. A reação da CUT é vergonhosa e prova, mais uma vez, que não é o que nunca, de fato, chegou a ser: uma central sindical. É um aparelho que se dedica cotidianamente ao trabalho de sustentar o projeto de poder de um partido político, projeto do qual, como instituição, é a principal beneficiária. Não fosse assim, seus antigos dirigentes ou sindicalistas a ela ligados não seriam hoje algumas das figuras mais poderosas da República: Luiz Inácio Lula da Silva (o próprio), Ricardo Berzoini (ministro do Trabalho), Olívio Dutra (ministro das Cidades), Luiz Gushiken (ministro da Propaganda), Jaques Wagner (Conselho de Desenvolvimento), Jair Menguelli (presidente do Sesi), Paulo Okamoto (presidente do Sebrae)... A lista é imensa. Caso se desça para o segundo escalão de governo, autarquias, estatais e entidades parassindicais, a companheirada toda vive com a pança na sombra. A retórica politicamente desavergonhada não teve receio nem mesmo de "denunciar" uma suposta tentativa de “privatização” da Febem. Não há nem sequer um miserável indício de que isso esteja a caminho. Ademais, ainda que estivesse, não haveria nisso crime nenhum. Quais foram os benefícios que crianças, adolescentes e sociedade obtiveram até agora do fato de a Febem ser pública? O que temos de comprovado, até aqui, é que tal condição não garantiu a boa prestação do serviço, mas certa estupidez nativa prefere satanizar uma alternativa que, não tendo sido jamais testada, de resto, nem mesmo está em cogitação. É só ideologia vagabunda e pretexto para baixo proselitismo. O governo do Estado de São Paulo tem de seguir em frente. Não pode temer o confronto com as forças retrógradas do país. Nesse, como em muitos outros casos, a sociedade enfrenta um paredão de reacionarismo e vilania política. É preciso que fique claro para todo mundo: quem quer a greve na Febem não são os funcionários ou a CUT, que nem mesmo existe como entidade autônoma; quem quer a greve é o PT. Porque, de fato, já botou o seu bloco na rua com vistas a 2006. São também espancadores, só que do Estado de Direito. |
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