A teoria é uma abstração, uma maneira de estruturar o raciocínio e interpretar a realidade. Ela não tem vida própria: depende integralmente do objeto analisado. Ela tem que interpretar, explicar as reações observadas. Se não consegue, é óbvio que a teoria ou não é adequada ou não está sendo utilizada da maneira adequada.
Hoje em dia, as autoridades econômicas estão repetindo o mesmo exercício retórico do primeiro governo Fernando Henrique Cardoso. Cria-se uma situação insustentável, pouco eficaz e, depois, vai se fazendo um check-list, levantando uma lista enorme de detalhes que estariam comprometendo o resultado final, transformando cada dado relativo em um diagnóstico absoluto.
Antes, havia o câmbio fixo. Agora, há uma meta inflacionária fixa em um momento em que nem a inflação internacional está sob controle.
Em uma economia completamente aberta, país nenhum tem controle total sobre sua política monetária. Monta-se em uma meta de inflação rígida, aumentam-se os juros para conter a demanda. O aumento dos juros traz capital de arbitragem. Esse capital entra, e o Banco Central tem duas alternativas. Não interfere, e o câmbio se aprecia até o limite da irresponsabilidade; ou compra reservas, a um custo fiscal tremendo... e o câmbio continua se apreciando.
Nas regras atuais, não há como segurar esse fluxo. O dólar entra a R$ 2,60. Lá fora, custa 4% ao ano. Aqui, consegue 20%. Em um ano, a taxa de equilíbrio é de R$ 3. Como segurar essa avalanche? Ou se coloca um mata-burro na porteira ou se taxa esse capital.
Na outra ponta, o crédito consignado em folha dispara feito um foguete, porque não há correias de transmissão entre a taxa Selic e o custo do financiamento para pessoa física. O BC aumenta os juros, os bancos reduzem um pouco mais seu "spread" (em uma linha de inadimplência baixíssima) e mandam bala.
Hoje em dia, as taxas de juros de longo prazo dos títulos públicos não acompanham a chamada curva de juros. Aumenta o curto prazo, o longo prazo não aumenta na mesma proporção. Pode-se alegar que é excesso de liquidez na economia. Mas pode-se sustentar que é por falta de fé nesses juros.
O BC vai dobrando a aposta, Copom após Copom, o mercado olha e sabe que ele não tem cacife nem para manter o câmbio nesse nível de apreciação nem sangue-frio para ver a dívida pública subir, como proporção do PIB (Produto Interno Bruto).
Os recursos externos entram, beliscam os juros, provocam mais apreciação no câmbio, mas nenhum agente econômico vai ter suas expectativas coordenadas pelos sunitas do BC. E aí vão se repetindo argumentos que nem seus autores acreditam, para justificar a ineficácia da política econômica. Ora seriam os créditos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), ora seriam os gastos públicos carimbados.
Seja qual for o diagnóstico, se quiser manter os juros elevados, o Banco Central terá de encontrar caminhos que reduzam o impacto fiscal. O custo desse aumento da dívida, com a Selic, vai se propagar por gerações.
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