domingo, abril 27, 2008

Discutir a relação


Brasil e Paraguai devem sentar-se à mesa para negociar investimentos, e não a tarifa de Itaipu, cujo valor está adequado

PASSADA A eleição que ungiu o ex-bispo Fernando Lugo na Presidência, chegou a hora de Paraguai e Brasil discutirem a relação bilateral. Não será conversa fácil, pois na campanha Lugo adotou uma litania nacionalista em torno da "soberania energética", com a qual pretende arrancar de Brasília a revisão do preço pago pela energia de Itaipu.
A hidrelétrica pertence ao Brasil e ao Paraguai em partes iguais. Pelo tratado de 1973, cada um tem direito a 50% da energia produzida. Caso uma das partes não use toda a cota, vende o excedente ao parceiro a preço de custo. O valor que os brasileiros pagam é justo: US$ 45,31 por megawatt-hora. A título de comparação, a energia da usina de Santo Antônio, no rio Madeira, recém-licitada, sairá por US$ 47.
Para construir Itaipu, os brasileiros tomaram empréstimos internacionais de US$ 12 bilhões. Já os paraguaios entraram com US$ 50 milhões -que lhes foram emprestados pelo Banco do Brasil. Brasileiros pagam seu quinhão nas contas de eletricidade. Os paraguaios honram sua parte nas obrigações abatendo-as do que teriam a receber pela energia excedente vendida ao Brasil. Dos US$ 45,31 a que teriam direito descontam US$ 42,50, ficando com apenas US$ 2,81. Por ano, entre royalties e compensações, levam US$ 375 milhões.
Pode parecer pouco, mas convém lembrar que o Paraguai entrou nesse negócio apenas com a água que passa do seu lado do rio e hoje é detentor de metade de um patrimônio avaliado em US$ 60 bilhões -quase três vezes o PIB do país, estimado em US$ 12 bilhões. Essa situação deverá valer até 2023, quando será paga a última "prestação" da dívida.
A esta altura, será muito difícil para Lula não ofertar a Lugo algum tipo de concessão em Itaipu, mas é preciso que ela ocorra nos termos do tratado de 1973 e que não implique sacrifícios aos consumidores brasileiros.
O campo em que o Brasil pode e deve ser generoso com o vizinho não é o dos contratos de energia, mas o dos investimentos. No médio e longo prazos, tanto Brasília como Assunção ganharão muito mais se o Paraguai se desenvolver e utilizar uma porção maior da energia a que tem direito. Atualmente, apenas 5% da eletricidade gerada por Itaipu abastece 95% da demanda paraguaia. O restante dá conta de 20% do gasto brasileiro.
O que o Paraguai realmente precisa não são alguns trocados a mais nos cofres do governo, mas investimentos produtivos que gerarão empregos e riqueza.
Para viabilizá-los, é necessário melhorar a infra-estrutura do país e reformar suas instituições. O Brasil pode ajudar no primeiro quesito, financiando projetos importantes como novas linhas de transmissão de energia e estradas para escoar a produção. Já no que diz respeito às instituições, esse é o desafio de Lugo, cuja eleição pôs fim a 61 anos de hegemonia do Partido Colorado.