quarta-feira, maio 28, 2014

A inflação e a dívida pública - EDITORIAL - Estadão

A inflação e a dívida pública - opiniao - versaoimpressa - Estadão


Além de encarecer a vida dos brasileiros, a inflação pressiona também o custo da dívida pública e prejudica a saúde financeira do governo. Nos 12 meses terminados em abril, o custo médio da dívida pública federal (DPF) subiu de 11,46% ao ano para 11,52%, segundo informou o Tesouro Nacional. O custo médio da dívida pública federal interna (DPFi) também aumentou, passando de 11,03% para 11,13% ao ano. A dívida ficou mais cara porque cresceu a participação de títulos corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e pela Selic, a taxa básica de juros. Essa taxa voltou a subir em abril do ano passado, quando os dirigentes do Banco Central (BC) decidiram intensificar o combate à alta de preços. Os investidores em papéis do governo tiveram um duplo estímulo para mudar suas preferências: tentaram defender-se da onda inflacionária e, ao mesmo tempo, aproveitar a remuneração maior oferecida pelos títulos vinculados à Selic.

A taxa básica foi elevada em 9 ocasiões nos últimos 12 meses, mas a inflação continua bem acima da meta, de 4,5% ao ano, e resistente. Os índices de preços têm subido mais lentamente nas últimas semanas. Ao mesmo tempo, vêm-se multiplicando os sinais de enfraquecimento da economia.

A demanda dos consumidores arrefeceu, o emprego tem crescido mais devagar e os indicadores de confiança dos empresários de vários setores pioraram. Diante desses sinais, analistas do setor financeiro passaram a apostar numa interrupção da alta de juros. Ainda hoje, no começo da noite, o Copom deverá anunciar uma nova decisão sobre os juros. Segundo a maior parte das previsões, os formuladores da política monetária deverão no mínimo iniciar uma pausa para avaliar os efeitos do aperto adotado nos últimos 12 meses.

Se essa aposta estiver correta, o Copom atenderá aos principais porta-vozes do empresariado, críticos habituais dos aumentos de juros. Esses empresários normalmente se mostram muito mais preocupados com o custo dos financiamentos do que com a alta de preços, mesmo quando a inflação dispara e se distancia muito da meta, como ocorreu várias vezes nos últimos quatro ou cinco anos. A decisão apaziguadora também será provavelmente bem vista pelos ministros econômicos e pela presidente Dilma Rousseff, empenhada na busca da reeleição e na conquista da simpatia dos líderes empresariais.

Se o Copom de fato interromper a alta da Selic, terá poucos meses para avaliar se o aperto iniciado há um ano de fato foi suficiente para frear a inflação. Pelas projeções correntes no mercado financeiro, a variação do IPCA deverá ser mais suave até julho ou agosto e em seguida ganhar novamente impulso. Na melhor hipótese, os preços continuarão subindo mais lentamente por um período mais longo e a inflação acumulada no fim do ano ficará abaixo de 6%. As projeções conhecidas até agora serão desmentidas e a política monetária poderá continuar mais frouxa do que nos últimos meses.

Mas nada garante, por enquanto, esse bom resultado. Os consumidores estão mais cautelosos, neste momento, mas o desajuste entre a demanda total e a oferta no mercado interno dificilmente será superado a curto prazo. A indústria continua estagnada e o investimento privado será provavelmente insuficiente, nos próximos meses, para mudar o quadro. Além disso, a gastança pública prossegue e o governo permanece dependente de receitas extraordinárias para alcançar a meta fiscal fixada para o ano. Além disso, o governo já se comprometeu com novo aumento do salário mínimo e, além disso, a adoção de qualquer medida de austeridade, durante a campanha, será uma enorme surpresa.

De toda forma, sobrou uma notícia boa no relatório divulgado ontem pelo Tesouro. Entre dezembro e abril a dívida pública federal diminuiu 3,31%, de R$ 2,122 trilhões para R$ 2,052 trilhões. Só em abril o Tesouro resgatou um total de R$ 47,06 bilhões. Novas boas notícias poderão surgir, nos próximos meses, se a inflação recuar e o custo da dívida diminuir. Mas, por enquanto, essa expectativa parece otimista demais.