sábado, dezembro 14, 2013

Panorama Carioca Gilberto Scofield Jr.

O GLOBO

A falta do debate público

Assim como todo fluminense, eu me sinto muito incomodado quando acompanho todas as desgraças que o Rio enfrenta — ano sim, outro também — em função das chuvas de verão. E não apenas pela omissão, lentidão ou simples incompetência de nossos governos municipais e estaduais, mas também pela ignorância da população sobre as questões de sustentabilidade por trás das tragédias.

RIO - Mais que isso: e a indignação que rola quando descubro que, em meio à tormenta das águas, a Câmara de Vereadores do Rio decide encerrar seus trabalhos? Alguém aí viu algum vereador preocupado (antecipadamente) com dragagem de córregos, drenagem de vias ou remoção de gente às margens de rios ou beira de morros, fatores que estão por trás dos alagamentos e deslizamentos que se espalham pela cidade durante as chuvas? Não. Nossos vereadores estão preocupadíssimos em não incomodar o prefeito. Ou batizar nomes de ruas. Ou fechar alianças entre o Rio e cidades no fim do mundo, tipo Vladivostok.

Não é muito diferente na Assembleia Legislativa, que entra em recesso semana que vem. Não vejo a questão da sustentabilidade no estado e nas cidades fluminenses ser objeto de discussão nos parlamentos mais importantes do Rio. Os Legislativos do nosso estado e da nossa cidade são uma claque destinada a bater palma para os governantes. Não geram debates sobre como melhorar a vida de cidadãos-eleitores. Não pensam o futuro das cidades e do estado. Viraram um briga de poder num saco de gatos que só busca legislar em benefício de seus grupos.

Essa indignação ficou ainda maior porque acabei de voltar de uma viagem à França, onde tive a oportunidade de visitar projetos de desenvolvimento sustentável nas cidades de Paris e Lyon (vamos falar sobre eles mais tarde). E me encantaram não apenas os projetos em si: incentivos para prédios que produzem sua própria energia, bairros que reciclam a água que consomem, cidades com iluminação inteligente, regiões metropolitanas que se associam para a coleta e a reciclagem de lixo compartilhada, sistemas de saneamento que cobrem 100% dos domicílios e ainda devolvem água limpa para rios e projetos agrícolas, entre outros. O que me chamou a atenção em quase todos esses projetos foi a participação ativa das comunidades ou de seus representantes durante o processo.

É certo que nem todas as decisões agradaram a todo mundo. Até porque tem sempre gente que, possuída por uma espécie de exu ideológico e político, é contra todas as decisões vindas de grupos com os quais não têm afinidade ideológica (à direita ou à esquerda), não importando se a proposta é ótima e fará um bem danado à população. Isso virou praticamente a regra no Rio (e no Brasil em geral). Mas na Europa, um continente que já exigiu a união impensável de opostos em momentos graves, como guerras e fomes, há uma certa ideia de força comunitária, que existe no Rio num grau muito pequeno. Aqui, a impressão que se tem é que quanto menos as pessoas conhecerem seus vizinhos ou participarem de reuniões de condomínio, de rua ou de associação de moradores, melhor. "Não quero perder privacidade me metendo com vizinhos", pensam, não importa se está todo mundo tirando foto pelado no Instagram ou no Facebook.

Um dos maiores debates europeus hoje, em comunidades e parlamentos, é sobre estações de trem (brilhantemente resumido numa recente edição da revista inglesa "Monocle", aliás). A ideia dos caras é transformar esses lugares — estações municipais e interestaduais — de lugares áridos e abandonados em ativos centros de socialização. Para isso, cada estação seria equipada com um mix de serviços locais, de mercadinhos a sapatarias, de agências de correio a livrarias. E mais: espaço para um depósito de bagagens, um posto policial, uma garagem de bicicletas, conexões com linhas de ônibus, metrô ou VLT, áreas verdes próximas, quiosques nas plataformas, painéis solares para captação de energia, acessibilidade 100%.

Alguém aí vê nossos deputados ou vereadores discutindo isso? Ou os governos? Ou a SuperVia?

NEM VOU entrar de novo aqui em detalhes sobre o trauma que é desembarcar no Aeroporto do Galeão, porque qualquer pessoa que já foi ao exterior sabe a dor da volta: horas na esteira de bagagem, horas no posto da Imigração (para voltar ao país, veja bem), horas no posto da Receita Federal e a selva dos táxis que fazem ponto no lugar — sejam eles táxis comuns picaretas, doidos para aplicar todo tipo de golpe no passageiro, seja pelo valor das tabelas dos táxis especiais (paguei R$ 90 para ir do aeroporto a Laranjeiras porque não tinha táxi comum, um percurso que deve custar no máximo R$ 50). Só queria lembrar uma coisa: estamos a seis meses da Copa do Mundo. O consórcio que adquiriu o Galeão (mais caro que o campo de Libra) já acordou para isso?


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