O GLOBO - 28/12
E papa renuncia? A
pergunta feita por Érica, a arrumadeira, foi o grande momento de espanto
do ano. Ele mostrou aos jornalistas que fazer plantão é preciso e que o
inesperado sempre acontece, inclusive o improvável em hora imprópria.
Segunda-feira de carnaval só tem carnaval, correto? Não. Foi o que o ano
de 2013 e a renúncia de Bento XVI provaram.
Depois de vários
dias mergulhada no mato, tentando entender o mundo Awá e as ameaças
vividas pelos índios no Maranhão, peguei a estrada de volta. Na aldeia, a
comunicação era difícil, quase impossível.
Foi assim que cheguei
a Zé Doca sem saber de nada do que se passava no Brasil. Era junho.
Paramos para comer, e as cenas de guerra de rua convocaram todos para
perto da televisão. Repórteres apanhando foi a primeira cena que vimos. E
o jornalista falava: no quarto dia de manifestações...
Quarto?
Só alguns dias na floresta e já se perde o fio da meada deste país.
Consegui acessar as mensagens e a do Alvaro Gribel era seca: "Volte."
Voltei já escrevendo no caminho, "Melhor ouvi-los", sugeri. O fenômeno
está até hoje não inteiramente entendido. Junho foi o mais complexo dos
meses. Houve cenas novas no país do futebol: dentro do Maracanã, o
Brasil ganhava a Copa das Confederações; fora do Maracanã, a população
enfrentava a polícia em protestos eloquentes.
Não dá para
imaginar 2013 sem as manifestações de junho. Houve revelações
importantes: a população é capaz de se mobilizar, parecemos com os
outros países, a polícia passou mal no teste, houve excessos, a imprensa
precisa entender melhor como cobrir esses eventos, os jornalistas
viraram duplo alvo, a resposta do governo foi pífia. Num primeiro
momento, congelamento de tarifas de transportes. Num segundo momento, a
presidente Dilma propôs cinco pactos, que foram, noves fora, zero.
Em
pleno feriado de 15 de novembro, outro ineditismo. Era evento já
esperado, mas muita gente duvidava que poderosos pudessem ir para a
prisão. Choro, ranger de dentes contra o STF e braços levantados não
mudaram o fato de que o Brasil passou a pôr na cadeia, por corrupção,
condestáveis do grupo que está no poder.
"O novo papa é
argentino", dizia o torpedo que recebi a caminho do trabalho. E o Brasil
adorou. Brasil e mundo, católicos ou não, foram gostando cada vez mais
do Papa Francisco. Ele é pop, surpreende, dá entrevista, admite
fraquezas, virou a pessoa do ano da "Time" e personalidade de 2013 mundo
afora.
Mandela estava no fim, já se sabia, mas o aperto de mão
entre Obama e Raul Castro foi surpresa. Que os EUA espionam todo mundo a
gente já sabia, mas bisbilhotar assuntos privados de Dilma e Merkel em
nome "de um mundo mais seguro" é bem estranho. Edward Snowden, e seus
arquivos vazados em Hong Kong, a caminho de Moscou, para um jornalista
americano morador da Gávea, no Rio, foi espanto e tanto.
Um
diplomata rebelar-se, pegar seu asilado esquecido na embaixada,
embarcá-lo numa longa viagem Bolívia adentro e aparecer no Brasil não é
coisa que se espere.
A queda de Eike Batista não surpreendeu quem
via com atenção sua maneira de inflar o valor dos ativos, mas o tamanho
do tombo pegou muita gente de surpresa. O governo finge espanto, mas
colocou dinheiro no grupo quando plataformas e navios já afundavam.
Política
é sempre a mesmice, mas a novidade foi o movimento da Marina. Batida
pela não aprovação do seu partido, ela conseguiu a atenção da imprensa
quando fez o movimento de abrigar-se no partido de Eduardo Campos.
De
uma profissão que vive do novo e do inesperado, os jornalistas terminam
o ano exaustos, mas sem motivos de queixa. Houve muita matéria-prima em
2013.