quinta-feira, agosto 08, 2013

No final da fila - RAUL VELLOSO


ESTADÃO - 08/08

O grande drama da economia brasileira nos últimos tempos é o baixo crescimento dos investimentos. Investir expande a capacidade de produção do País, além de aumentar a produtividade, crucial para o crescimento do PIB. É só ver o progresso econômico chinês das últimas décadas. Em contraste, prevalece no Brasil o modelo de expansão do consumo, que não consegue mais puxar a carruagem sozinho.

Durante alguns anos, os investimentos subiram acima do PIB. Mas, da crise do subprime para cá, não crescem mais do que ele. Resultado: tendência de crescimento do PIB abaixo do desempenho recente e da média dos emergentes. Há excesso de interferência do governo em vários segmentos da economia, o que obviamente afugenta investidores. Mas tomemos o caso dos transportes, uma prioridade sobre a qual não há dúvida. Eles são parte do setor de serviços, um claro beneficiário do modelo pró-consumo - na ausência de concorrentes externos -, mas cuja expansão, por suas características próprias, depende fundamentalmente da ação governamental. Aqui, não se trata de muita interferência, mas de interferência inadequada.

O Brasil tem uma das piores situações no ranking de infraestrutura de transportes do mundo. Segundo o Fórum Econômico Mundial, é o 107.º pior entre 144 países. Do lado do governo, o problema é que o modelo político em vigor desde a Constituição de 1988 privilegia, na União, pagamentos a pessoas, em detrimento de investimentos. Tanto que, em 2012, os recursos para investimentos em transportes representaram só 1,3% do gasto total.

Diante da baixa disposição política para reformar o sistema de pagamentos a pessoas, projeta-se uma situação duplamente mais onerosa para os contribuintes nos próximos 40 anos. Seja porque o sistema é excessivamente concessivo, seja pelo rápido envelhecimento da população. Os gastos em saúde devem também crescer muito.

A hipótese da concessão de serviços públicos ao setor privado é a única saída à vista para os segmentos em que a rentabilidade é atrativa. Isso vem sendo tentado, mas enfrenta enorme resistência política. Sem falar na conhecida incapacidade de gestão do governo não só para executar obras, como para administrar concessões. Políticos relevantes se insurgem contra a cobrança por serviços públicos de baixa qualidade, mas não fazem nenhum esforço para ajustar a grande folha de pagamento que o governo administra. No fim, é a sociedade quem paga pelo baixo crescimento do PIB. O movimento em favor da emenda constitucional do "orçamento impositivo" no Congresso não passa de mera busca de um carimbo aplicado a uma cota mínima de gastos para cada parlamentar patrocinar, sem tocar na raiz do problema.

Quanto à indústria de transformação, fica cada vez mais clara a incompatibilidade da expansão de boa parte de seus componentes com o modelo de rápido crescimento do consumo. Por esse modelo, sobe também rapidamente a demanda por serviços e, em seguida, aumentam os salários no setor e os respectivos preços recebidos. Sem a mesma proteção natural - um mercado sem competidores - que os serviços têm em relação à competição externa, a indústria local cede gradualmente espaço às importações, à medida que sobe o custo unitário do trabalho (salários em dólares divididos pela produtividade da mão de obra), também pressionado pela tendência inevitável à apreciação cambial real, implícita no modelo pró-consumo. Assim crescem menos sua produção e os investimentos, a despeito da depreciação forçada do real de 2012 e do realinhamento cambial que ora se verifica no mundo.

Já os investimentos em commodities dependem dos preços externos e das condições locais da infraestrutura de transportes - caóticas, como se vê -, à espera, também, de uma mudança de comportamento do País em favor de sua melhoria. Portanto, interferência em excesso (incluindo a cara e excessiva proteção à indústria) e falta de prioridade para a infraestrutura são problemas-chave que deveriam ocupar as mentes governamentais.